02 maio, 2011

"A Humilhação" - Philip Roth


Tinha perdido a magia. O ímpeto estava esgotado. Nunca tinha falhado no teatro, tudo quanto tinha feito fora forte e bem-sucedido, e então aconteceu o terrível: deixou de saber representar. Subir ao palco tornou-se uma aflição. O seu talento estava morto.
Assim começa esta farsa de Philip Roth, sobre um actor de grandes papéis - Simon Axler - que aos sessenta e tal anos descobre que não está a representar o papel de alguém que está a desmoronar-se, é ele próprio que está a desmoronar-se, e representar o papel do seu próprio fim, isso é outra coisa, uma coisa transbordante de terror e medo.
Tudo acabou para Simon Axler, um homem que queria viver, interpretando o papel de um homem que queria morrer.
Não consegue voltar aos palcos. Todos os dias pensa no suicídio como solução. A mulher, Victoria, abandona-o e ele fica aterrado com a hipótese de vir a concretizar o acto mais difícil que existe. Telefona ao seu médico e pede-lhe para ser internado num hospital psiquiátrico.
Mais tarde, recuperado da depressão, vive momentos de felicidade junto de Pegeen, lésbica, vinte e cinco anos mais nova, filha de velhos amigos.
Como se estivesse no teatro, vai transformando o aspecto rapazola dela, numa orgia de mimos e gastos. Recupera a confiança, o medo e quer reconstruir a vida.
Mas, tudo acaba quando é trocado por uma mulher.
Incapaz de representar o papel do amante abandonado, incapaz de continuar a gerir fracassos, decide suicidar-se.
Como encontrará coragem? Fingindo que se está a suicidar numa peça, num palco mágico.

O autor voltou aos seus temas habituais: família, idade, morte, sexo.
A relação cheia de riscos e aberrante com Pegeen é descrita de forma genial, hilariante.
A vida é um palco.

Nada tem uma razão válida para acontecer. Perde-se, ganha-se – tudo é capricho. A omnipotência do capricho. A probabilidade da reviravolta. Sim, a imprevisível reviravolta e o seu poder.

A Humilhação, de Philip Roth
Dom Quixote, 2011
Tradução de Francisco Agarez
127 págs.

7 comentários:

  1. Acabei ontem de ler o livro. Gostei, não é o meu autor preferido, mas é um dos melhores autores que li até hoje.
    Relativamente ao livro, é curioso como o autor ao longo do livro nos vai falando das mais diversas formas de humilhação. E também é interessante a forma como as pessoas reagem a essa humilhação. A reitora fica em transe, Axler suicida-se e antes tinha sido internado. A jovem que vê a filha ser violada pelo marido, mata o marido. Ou seja, para cada um de nós, a vários tipos de humilhação, e cada um de nós reage de maneira diferente.

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  2. Olá Tiago,
    Ainda bem que gostou do livro. Se ler mais um ou dois do autor ficará, como eu, "apanhada"...
    Engraçado que já reparei que a palavra "humilhação" aparece imensas vezes em todos os livros dele. A herança judaica e os seus fantasmas... sempre...
    Neste momento estou a reler "Todo-o-Mundo". À frente da data da primeira leitura escrevi - Fabuloso! Vamos a ver se mantenho a opinião.
    Sugiro que leia a "Pastoral Americana".

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  3. Sim recordo-me da Mancha Humano, havia na história muita gente humilhada. Não me posso esquecer daquela personagem que não podia ver um pessoa com os olhos em bico, pois queria logo mata-la (tinha esse trauma por causa da Guerra do Vietname), tenho um amigo meu que diz o mesmo quando vê um negro, será escusado dizer que teve na guerra do ultramar em Angola.
    Um pequeno reparo.
    Ainda bem que Pegeen acabou com Axler, é que ao ritmo que iam, a sua conta bancária não devia durar muito tempo. ;-) Seria mais uma forma de humilhação para ele.

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  4. Teresa,

    Existem livros que precisamos de tempo para perceber a sua qualidade. Foi o que aconteceu comigo com a leitura deste livro de Roth.
    É sem duvida uma excelente obra, as depressões atingem cerca de 20% da nossa população, mas Roth vai mais longe e fala de muitos tipos de humilhação, o que torna o livro ainda mais abrangente.
    Já reparou, o que para uns é uma extrema humilhação, para outros é uma coisa tão vulgar como um fumador fumar um cigarro! Essa é na minha opinião uma das principais mensagens da obra.
    Confesso que assim que Roth editar um novo livro, vou comprar logo a primeira edição

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  5. Olá Tiago,
    Concordo plenamente consigo. Philip Roth tem o dom de nos transmitir mensagens nas entrelinhas.
    É um prazer ler os seus livros e também eu aguardo ansiosamente a chegada de um novo.

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  6. Fantástico!:

    http://numadeletra.com/29061.html

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  7. Agora que a descoberta foi feita, tenho a certeza que irá "devorar" toda a obra do autor.
    Todas as suas histórias são um misto de sério/rizível e viciantes. Ele é o meu preferido.
    Boas leituras!

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