27 junho, 2014

Frases soltas... "Levantado do chão" de José Saramago

"O que há mais na terra, é paisagem. Por muito que do resto lhe falte, a paisagem sempre sobrou, abundância que só por milagre infatigável se explica, porquanto a paisagem é sem dúvida anterior ao homem, e apesar disso, de tanto existir, não se acabou ainda.
Não faltam cores a esta paisagem. Porém, nem só de cores. Há dias tão duros como o frio deles, outros em que se não sabe de ar para tanto calor: o mundo nunca está contente, se o estará alguma vez, tão certa tem a morte.
Tanta paisagem. Um homem pode andar por cá uma vida toda e nunca se achar, se nasceu perdido."


(Pintura de Maria Manuel Delgado - foto tirada na net)

20 junho, 2014

"Amor" - António Mega Ferreira

Eu penso em ti, ainda mais do que te digo, e tu estás em tudo, mesmo quando não te penso...

Alguma coisa se passou na vida de Winnie, no dia em que fez dezasseis anos. O quê, não se sabe ao certo. Vinte anos depois de a ter conhecido e amado, um homem parte à descoberta do segredo. No final, espera-o a revelação de um vazio e uma pergunta: onde reside a essência do amor?

É belíssima esta história de amor.
Os protagonistas são uma mulher à beira dos cinquenta anos e um  jovem de pouco mais de vinte.
Eu li-a num ápice e dificilmente a esquecerei.
Saiba qual é o segredo de Winnie lendo as 77 páginas. Aconselho que pegue num lápis, pois há nelas muitas pétalas de amor para sublinhar.
Como esta:
Amo-te absoluta, impossível e fatalmente... E ouço música porque ouvimos música quando amamos, e tudo, no amor, é música, acústica da alma que quer ser devorada, e, neste caso, dor (tão deliciosamente insuportável) de amar sem sequência nem expectativa de contrapartida, amar unicamente o puro objecto que desgraçadamente amamos.
E esta:
... eu amo não a ideia de amar-te... mas a ideia de perder-me no meu amor por ti.
E ainda esta:
... quando penso nas coisas que ainda me falta fazer na vida, é em ti que penso.
Encontre outras e aprenda a chamar amor ao amor.
Amei!

Amor, de António Mega Ferreira
Ed. Assírio & Alvim, 2002
77 págs.

13 junho, 2014

"Rebeldes" - Sándor Márai

Só quem peca se purifica.
Publicado em 1930, este é o terceiro romance de Sándor Márai (o mestre das paixões), autor do aclamado “As velas ardem até ao fim”. (Se ainda não leu, leia).
Neste romance o tema principal não é o amor, é a amizade. Aqui não há um triângulo amoroso, há um bando de rapazes, revoltados contra tudo e a tudo dispostos.
O que os une?
É muito difícil dizer o que aglutina as pessoas, especialmente na juventude, quando os interesses ainda não tecem as amizades.
A história conta as aventura e desventuras do bando, num enredo de erros e fúrias, cumplicidades e traições, sofrimentos e cobardia – de inconfessáveis atracções e de ambíguas repulsas, no final da I Guerra, numa pequena cidade húngara, longe da frente.
Enquanto esperam pelo dia em que terão de vestir a farda e partir para o turbilhão da guerra, entregues a si próprios, os rapazes distraem-se com brincadeiras, jogos, leituras, representação de histórias, passeios.
Com os pais longe, a combater, eles são livres, independentes, sem limites.
Nos primeiros tempos, não precisavam de dinheiro para as brincadeiras. A questão do dinheiro só surgiu quando a realização de certas experiências e iniciativas veio exigir recursos cada vez mais complexos.
Béla foi o primeiro a roubar. Roubou dinheiro da caixa do pai…
Muitos roubos depois… alugam um espaço, um esconderijo, fora do perímetro de acção dos pais, professores, autoridades.
Ali começam a conhecer-se e unem-se numa cumplicidade secreta, feita de descobertas, excessos, segredos, mentiras, intrigas e brincadeiras perigosas.
Ali libertam os demónios da sua revolta contra o mundo.
Ali experimentam tudo, confessam tudo, falam de tudo - nunca da guerra, isso deixam para os adultos
Esse foi o tempo das brincadeiras a sério. Essa foi a segunda infância, mais consciente da culpa, mas sem limites, mais excitante e mais doce.
Já o bando se consolidara quando Amadé - o actor - chega à cidade. É o dançarino cómico da companhia. Tem quarenta e cinco anos. Tem barriga e papada. Usa peruca. Tem a cabeça de um cavalo. Tem a mandíbula saliente. É míope. Não joga às cartas. Usa dois anéis nos dedos carnudos.
O actor vivia os movimentos verdadeiros da vida apenas quando representava; tal como eles sentiam mais verdadeira do que qualquer realidade a própria vida escondida por trás da realidade.
Certo dia os rapazes conhecem o actor. Logo na primeira hora ele propôs que se tratassem por tu. Duas semanas depois convidou-os para sua casa. Conquista-os com festas teatrais divertidas. Entra para o bando.
Quem é ele? O que pretende deles? Em que perversas tramóias os vai meter? Será trágico o fim do bando?
"Rebeldes" é um romance perturbador. Recomendo-o a adolescentes... 
Os senhores… não conhecem ainda a vida. Aprende-se devagar.
... e a adultos, claro!

Rebeldes, de Sándor Márai
Tradução de Ernesto Rodrigues
Ed. Dom Quixote, 2008
239 págs.

06 junho, 2014

10º - Você sabe em que livro se esconde este “primeiro parágrafo"?

"Habituei-me a ordenar as recordações da minha vida através de uma relação de namorados e livros."

Resposta do 9º “Primeiro Parágrafo”:
Em “Solar”, de Ian McEwan, ed. Gradiva, 2010