Tinha perdido a magia. O ímpeto estava esgotado. Nunca tinha falhado no teatro, tudo quanto tinha feito fora forte e bem-sucedido, e então aconteceu o terrível: deixou de saber representar. Subir ao palco tornou-se uma aflição. O seu talento estava morto.
Assim começa esta farsa de Philip Roth, sobre um actor de grandes papéis - Simon Axler - que aos sessenta e tal anos descobre que não está a representar o papel de alguém que está a desmoronar-se, é ele próprio que está a desmoronar-se, e representar o papel do seu próprio fim, isso é outra coisa, uma coisa transbordante de terror e medo.
Tudo acabou para Simon Axler, um homem que queria viver, interpretando o papel de um homem que queria morrer.
Não consegue voltar aos palcos. Todos os dias pensa no suicídio como solução. A mulher, Victoria, abandona-o e ele fica aterrado com a hipótese de vir a concretizar o acto mais difícil que existe. Telefona ao seu médico e pede-lhe para ser internado num hospital psiquiátrico.
Mais tarde, recuperado da depressão, vive momentos de felicidade junto de Pegeen, lésbica, vinte e cinco anos mais nova, filha de velhos amigos.
Como se estivesse no teatro, vai transformando o aspecto rapazola dela, numa orgia de mimos e gastos. Recupera a confiança, o medo e quer reconstruir a vida.
Mas, tudo acaba quando é trocado por uma mulher.
Incapaz de representar o papel do amante abandonado, incapaz de continuar a gerir fracassos, decide suicidar-se.
Como encontrará coragem? Fingindo que se está a suicidar numa peça, num palco mágico.
O autor voltou aos seus temas habituais: família, idade, morte, sexo.
A relação cheia de riscos e aberrante com Pegeen é descrita de forma genial, hilariante.
A vida é um palco.
Nada tem uma razão válida para acontecer. Perde-se, ganha-se – tudo é capricho. A omnipotência do capricho. A probabilidade da reviravolta. Sim, a imprevisível reviravolta e o seu poder.
A Humilhação, de Philip Roth
Dom Quixote, 2011
Tradução de Francisco Agarez
127 págs.
Acabei ontem de ler o livro. Gostei, não é o meu autor preferido, mas é um dos melhores autores que li até hoje.
ResponderEliminarRelativamente ao livro, é curioso como o autor ao longo do livro nos vai falando das mais diversas formas de humilhação. E também é interessante a forma como as pessoas reagem a essa humilhação. A reitora fica em transe, Axler suicida-se e antes tinha sido internado. A jovem que vê a filha ser violada pelo marido, mata o marido. Ou seja, para cada um de nós, a vários tipos de humilhação, e cada um de nós reage de maneira diferente.
Olá Tiago,
ResponderEliminarAinda bem que gostou do livro. Se ler mais um ou dois do autor ficará, como eu, "apanhada"...
Engraçado que já reparei que a palavra "humilhação" aparece imensas vezes em todos os livros dele. A herança judaica e os seus fantasmas... sempre...
Neste momento estou a reler "Todo-o-Mundo". À frente da data da primeira leitura escrevi - Fabuloso! Vamos a ver se mantenho a opinião.
Sugiro que leia a "Pastoral Americana".
Sim recordo-me da Mancha Humano, havia na história muita gente humilhada. Não me posso esquecer daquela personagem que não podia ver um pessoa com os olhos em bico, pois queria logo mata-la (tinha esse trauma por causa da Guerra do Vietname), tenho um amigo meu que diz o mesmo quando vê um negro, será escusado dizer que teve na guerra do ultramar em Angola.
ResponderEliminarUm pequeno reparo.
Ainda bem que Pegeen acabou com Axler, é que ao ritmo que iam, a sua conta bancária não devia durar muito tempo. ;-) Seria mais uma forma de humilhação para ele.
Teresa,
ResponderEliminarExistem livros que precisamos de tempo para perceber a sua qualidade. Foi o que aconteceu comigo com a leitura deste livro de Roth.
É sem duvida uma excelente obra, as depressões atingem cerca de 20% da nossa população, mas Roth vai mais longe e fala de muitos tipos de humilhação, o que torna o livro ainda mais abrangente.
Já reparou, o que para uns é uma extrema humilhação, para outros é uma coisa tão vulgar como um fumador fumar um cigarro! Essa é na minha opinião uma das principais mensagens da obra.
Confesso que assim que Roth editar um novo livro, vou comprar logo a primeira edição
Olá Tiago,
ResponderEliminarConcordo plenamente consigo. Philip Roth tem o dom de nos transmitir mensagens nas entrelinhas.
É um prazer ler os seus livros e também eu aguardo ansiosamente a chegada de um novo.
Fantástico!:
ResponderEliminarhttp://numadeletra.com/29061.html
Agora que a descoberta foi feita, tenho a certeza que irá "devorar" toda a obra do autor.
ResponderEliminarTodas as suas histórias são um misto de sério/rizível e viciantes. Ele é o meu preferido.
Boas leituras!