O sucesso sempre incomoda os medíocres ambiciosos, os sonhadores incapazes, os fracassados em geral. (Rubem Fonseca)
"Eu sou um ladrão.
Como é que o sujeito se torna ladrão? A polícia sabe? Não, não sabe. O advogado criminalista sabe? Não, não sabe. O psicólogo sabe? Não, não sabe. O psiquiatra sabe? Não, não sabe. O Psicanalista sabe? Não, não sabe. (…)
Pobreza? O sujeito se torna ladrão porque é pobre? Que besteira. Tem ladrão mais rico do que ladrão pobre, está provado que quanto mais dinheiro o sujeito tem mais dinheiro ele quer ter. (…)
Distúrbio mental? Eu sou ladrão e não sou maluco, nem tenho distúrbio mental. E que merda é exatamente isso de distúrbio mental? (...)"
(Excerto do conto "Um bom trabalho")
"Meu nome é Maria da Graça e tenho 62 anos de idade. (É mentira, tenho 72, mas pareço ter bem menos,então digo para todo o mundo que tenho 62, e ninguém duvida.)
Não pensem que fiz isso que chamam de operação plástica, ou coloquei Botox, essa coisa que todas as mulheres fazem. Me disseram que alguns camelôs fazem Botox nas regiões pobres da cidade. Eles vão pelas ruas gritando «olha o Botox, bom e barato», às vezes usam até alto-falantes. E a coisa é feita ali no meio da rua, ninguém acha nada de mais. E funciona. Dizem que é um Botox que vem da China, por isso é barato. Tudo o que vem da China é barato, mas na maioria das vezes é também uma porcaria. Por exemplo, o tal cigarro electrónico,aquela coisa que vaporiza falsa nicotina que está na moda. O palerma pensa que está fumando um cigarro com gosto de tabaco, mas é um aerossol químico. Ainda bem que eu não fumo. Beber eu bebo um pouco, champanhe é claro, quem é que não gosta de uma champanhe? Ou é um champanhe? Preciso comprar um dicionário para eclarecer essas coisas. (...)"
Não pensem que fiz isso que chamam de operação plástica, ou coloquei Botox, essa coisa que todas as mulheres fazem. Me disseram que alguns camelôs fazem Botox nas regiões pobres da cidade. Eles vão pelas ruas gritando «olha o Botox, bom e barato», às vezes usam até alto-falantes. E a coisa é feita ali no meio da rua, ninguém acha nada de mais. E funciona. Dizem que é um Botox que vem da China, por isso é barato. Tudo o que vem da China é barato, mas na maioria das vezes é também uma porcaria. Por exemplo, o tal cigarro electrónico,aquela coisa que vaporiza falsa nicotina que está na moda. O palerma pensa que está fumando um cigarro com gosto de tabaco, mas é um aerossol químico. Ainda bem que eu não fumo. Beber eu bebo um pouco, champanhe é claro, quem é que não gosta de uma champanhe? Ou é um champanhe? Preciso comprar um dicionário para eclarecer essas coisas. (...)"
(Excerto do conto "O mundo é nosso")
"Meu netinho querido, sabe por que o mundo antigamente era melhor? Sou um velho ranzinza e gosto de fazer afirmações que certas pessoas consideram infundadas. Mas uma coisa é certa: o mundo antigo era melhor porque havia apenas ricos e pobres, só duas categorias. E sabe o que aconteceu? Os pobres, lentamente, foram deixando de ser pobres. E isso acabou por influenciar o comércio, os comerciantes passaram a fazer coisas para os pobres, uma porcaria, é claro. E pobre gosta de fazer filhos, mas antes, graças a Deus, eles morriam de doenças. Quando os pobres passaram a ter dinheiro para cuidar dos filhos, pagando médicos e dando-lhes de comer melhor, essa praga dos filhos foi aumentando. Por que a população do mundo chegou a esse nível catastrófico? São os pobres fazendo filhos.(...) Que é isso? Meu netinho, larga o meu pescoço, você está apertando com muita força, me sufocando, estou sem ar, ai... ai... estou..."
(Excerto do conto "Netinho querido")Filho de portugueses transmontanos que emigraram para o Brasil, Rubem Fonseca nasceu em Juiz de Fora, Minas Gerais, em 1925. Faleceu no Rio de Janeiro, onde vivia desde os oito anos, no passado dia 15 de Abril.
Contista, romancista, ensaísta, guionista e «cineasta frustrado», foi galardoado com diversos prémios literários, nomeadamente com o Prémio Camões, em 2003.
Leia tudo o que encontrar sobre este «senhor contista», dono de uma escrita original, simples, irónica, inteligente, sagaz, risível.
Leia tudo o que encontrar sobre este «senhor contista», dono de uma escrita original, simples, irónica, inteligente, sagaz, risível.
Eu vou, com certeza, ler mais sobre o escritor que «gritava vivas à Língua Portuguesa».
Mais sobre a vida e obra de Rubem Fonseca aqui.
Mais contos aqui no Rol.
(foto da net)
Era um escritor com uma excelente ironia e uma capacidade de narrativa impar. Confesso que não li muita coisa dele. Tive pena que nos tivesse deixado. Mas a sua obra fica e vou procurar lê-lo mais.
ResponderEliminarBonita homenagem, minha querida Amiga Teresa.
Cuidemo-nos. Um grande beijo.
Bom dia de paz, querida amiga Teresa!
ResponderEliminarPerdemos mais um grande escritor e você pôs um pensamento importante na entrada do seu post.
Amo quem se dedica à literatura.
Fez muito bem em homenageá-lo.
Que bom que o aprecias!
Tenha dias abençoados!
Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem
Eu não li nadinha sobre ele (além do que aqui está), mas também vou ler. Desde que vi e ouvi a sua intervenção nas Correntes de Escrita que julgo valer a pena.
ResponderEliminarBom Dia
Bom dia:- Exiuste de tudo um pouco. Coneço um casal de médicos que tem um filho e uma filha adolescentes. A rapariga ( 16 anos ) anda sempre com euros na carteira. É uma estudante brilhante. No entanto, já deu vários problemas aos pais ( e à polícia ) porque não consegue ( diz ela ) entrar e sair de um hipermercado sem lá dentro comer um chocolate - só para ter o gosto de não o pagar na caixa. Está provado medicamente que ela sofre de um certo distúrbio mental, que se acentua, quando passa junto aos chocolates. Discutível? Sim. E muito ...
ResponderEliminar.
Saudações poéticas
Vou procurar porque confesso que não conheço.
ResponderEliminarBeijo
Procura Pedro.
EliminarOs contos são curtos, bem doseadas de ironia, humor inteligente e algum picante delicioso.
Eu, confesso, usei o «lápis azul».
Beijo.
Uma frase sábia do Rubem.
ResponderEliminarIsabel Sá
Brilhos da Moda
Oi Teresa, gostei muito da leitura, cheios de ironia inteligente, tive que ler e reler com atenção para captar e compreender.
ResponderEliminarOs grandes escritores dessa geração estão indo, outros chegam, não sei se melhores ou não,são vivências em mundos diferentes e outras percepções.
Abraço!
Olá, Teresa!
ResponderEliminarFiquei muito contente ao ver que tu homenageaste Rubem Fonseca, que nos deixou neste mês de abril. Penso que ele merece muitas homenagens, pois foi um escritor singular. Foi grande no romance, no conto e na crônica. Eu tive a oportunidade de ler tudo o que Rubem Fonseca escreveu nesses gêneros literários. Não tenho nenhuma crítica negativa a tudo o que escreveu.
Votos de uma boa quinta-feira, com os cuidados com o coronavírus, Teresa.
Beijo.
Pedro
Teresa, querida amiga, Rubem Fonseca era genial, seus contos e romances eram uma mistura de amargura e humor, violência e ternura, o grotesco e o requintado. Uma leitura picante e muito agradável, como em 'Lucia McCartney'. 'A Confraria das Espadas' da (Companhia das Letras), fala do prazer e da morte, reúne 8 contos, não faz muito tempo que li esse, entre outros.
ResponderEliminarGanhou inúmeros prêmios, como Coruja de Ouro, o Kikito - do Festival de Cinema de Gramado, como roteirista de 'Stelinha' - aqui no meu Estado, o Prêmio Jabuti, o Prêmio Camões.
Perdemos um grande escritor, mas ficou sua obra para sempre. Muito boa tua homenagem, um grande carinho, o que puderes ler desse genial escritor, vai fundo!
Beijo, querida!
Querida Teresa
ResponderEliminarBela resenha e homenagem a Rubem Fonseca, falecido recentemente.
Nunca li nada dele, acreditas? É esquisito lembrarmo-nos de ler um autor só depois da sua morte ou quando ganhou um prémio. Dá ideia que a noção de que temos tempo se aloja em nós, deixando para depois o que devíamos fazer hoje.
Ele então que ganhou tantos Prémios!
Muito obrigada, minha amiga.
Beijinhos
Olinda
Só conheço de nome. Tenho um livro, uma antologia das "Obras primas do conto brasileiro", mas infelizmente Rubem Fonseca não faz parte, talvez que na data da edição do livro 1966, ele ainda não tivesse alcançado o patamar que tinha na atualidade e por isso não esteja representado nele.
ResponderEliminarAbraço e saúde
Sabe Teresa adoro ler o Rubem por tudo isto que postou dele e muito mais na sua irreverencia e ironia clássica. Muito boa sua seleção deste titãs que perdemos, mas ficou a obra.Assim como adoro o Manoel de Barros, depois veja por aí.
ResponderEliminarQue bom sempre passar aqui e tomar este banho de cultura e belas seleções.
Grato amiga por pensar em nós.
Beijos