Brodeck é escrivão numa aldeia perdida algures em inóspitas montanhas. Elabora relatórios para a Administração sobre o estado da flora, das árvores, das estações, da caça, da neve, das chuvas...
A vida fluí calma na pequena aldeia, até ao malogrado dia em que a guerra ali chega. Enquanto alguns habitantes tentam agradar ao invasor, Brodeck reage com passividade e, por isso, é deportado para um campo de concentração.
Quando a guerra termina o Cão Brodeck (era assim que lhe chamavam os guardas do campo) regressa a casa e ao seu trabalho de escrivão, com a concordância de todos os habitantes que expiavam a culpa do colaboracionismo com o inimigo.
Vem diferente, isola-se, faz grandes passeios e não procura a companhia dos homens da aldeia, que «têm a cabeça cheia de selvajaria e de imagens de sangue». Homens tolos, falsos puritanos, que cometerão o pior dos crimes sobre um estrangeiro que escolheu aquela aldeia para viver, um homem cordial e educado, que ocupa o tempo em longas e solitárias caminhadas, e a retratar a aldeia e os seus habitantes. Habitantes que não gostam dos seus modos estranhos, muito menos de se verem retratados por ele, e o matam, perante a passividade das autoridades.
Vem diferente, isola-se, faz grandes passeios e não procura a companhia dos homens da aldeia, que «têm a cabeça cheia de selvajaria e de imagens de sangue». Homens tolos, falsos puritanos, que cometerão o pior dos crimes sobre um estrangeiro que escolheu aquela aldeia para viver, um homem cordial e educado, que ocupa o tempo em longas e solitárias caminhadas, e a retratar a aldeia e os seus habitantes. Habitantes que não gostam dos seus modos estranhos, muito menos de se verem retratados por ele, e o matam, perante a passividade das autoridades.
Brodeck, o único habitante da aldeia que sabe trabalhar com as palavras, tem de elaborar um relatório oficial que branqueie o crime, sem procurar o que «não existe, ou já não existe». Aceita, contrariado e amedrontado.
À medida que escreve o relatório oficial – sempre controlado, espiado, cercado - escreve outro onde intercala na história do homem misterioso (nunca lhe perguntaram o nome e ele falava pouco, muito pouco) factos da sua própria vida. E desvenda segredos sombrios, escondidos em cada pessoa, pedra, casa, rua, árvore, daquela aldeia, onde não há inocentes. Aldeia que um dia ele também escolheu para viver. Só que nesse tempo, ninguém tinha medo de estrangeiros e foi bem recebido. Agora, o medo transformava os homens. Brodeck sabia-o. Aprendeu no campo de concentração.
Finalizado o relatório, o seu relatório não o oficial, o escrivão entrega-o ao presidente da Câmara que depois de o ler lhe transmite: «escreves bem, Brodeck, não nos enganámos quando te escolhemos…mas tudo o que pertence a ontem pertence à morte, e o que importa é viver… é tempo de esquecer ... os homens precisam de esquecer.»
E logo, logo, Brodeck tem de fugir da aldeia. Por quê?
E logo, logo, Brodeck tem de fugir da aldeia. Por quê?
Eu sei! Saiba também, “ouvindo” Brodeck, narrador-personagem inesquecível de "O Relatório de Brodeck", brilhante romance de Philippe Claudel.
... às vezes é preferível não voltarmos à terra de onde partimos. Lembramo-nos do que deixámos, mas nunca se sabe o que iremos encontrar, sobretudo quando os homens foram atingidos por uma loucura duradoura.
Philippe Claudel é um escritor extraordinário. É dele "Almas cinzentas", um romance em jeito de thriller , que se lê e dificilmente se esquece. Veja por quê:
"Inverno de 1917. Numa pequena povoação da Lorena, a poucos quilómetros do campo de batalha onde decorre uma das maiores carnificinas da história da Europa, é descoberto o cadáver de "Lírio-do-Vale", uma menina de dez anos."
Um jovem é acusado da morte da criança e executado, ainda que uma testemunha diga que a viu com o Procurador da terra na noite do crime
Sem condenar nem julgar alguém, mas sempre duvidando da culpa do jovem executado, o polícia da aldeia investiga e descobre que a verdade é indesejada quando os poderosos da terra estão envolvidos, e que existe algo mais forte do que o ódio: as regras sociais.
Vinte anos depois, ele relembra o dia do crime e os acontecimentos que o precederam e que se lhe seguiram. «Não sei bem por onde começar. É bastante difícil. Há todo esse tempo passado, que as palavras não recuperarão, e também os rostos, os sorrisos, as chagas. Mas ainda assim preciso de tentar dizer. Dizer o que me vai no coração....»
E diz, diz tudo nesta história que "termina com a tomada de consciência de que, na fronteira entre o bem e o mal, todos somos a um tempo culpados e inocentes, justos e injustos, almas cinzentas e atormentadas.”
... às vezes é preferível não voltarmos à terra de onde partimos. Lembramo-nos do que deixámos, mas nunca se sabe o que iremos encontrar, sobretudo quando os homens foram atingidos por uma loucura duradoura.
Philippe Claudel é um escritor extraordinário. É dele "Almas cinzentas", um romance em jeito de thriller , que se lê e dificilmente se esquece. Veja por quê:
"Inverno de 1917. Numa pequena povoação da Lorena, a poucos quilómetros do campo de batalha onde decorre uma das maiores carnificinas da história da Europa, é descoberto o cadáver de "Lírio-do-Vale", uma menina de dez anos."
Um jovem é acusado da morte da criança e executado, ainda que uma testemunha diga que a viu com o Procurador da terra na noite do crime
Sem condenar nem julgar alguém, mas sempre duvidando da culpa do jovem executado, o polícia da aldeia investiga e descobre que a verdade é indesejada quando os poderosos da terra estão envolvidos, e que existe algo mais forte do que o ódio: as regras sociais.
Vinte anos depois, ele relembra o dia do crime e os acontecimentos que o precederam e que se lhe seguiram. «Não sei bem por onde começar. É bastante difícil. Há todo esse tempo passado, que as palavras não recuperarão, e também os rostos, os sorrisos, as chagas. Mas ainda assim preciso de tentar dizer. Dizer o que me vai no coração....»
E diz, diz tudo nesta história que "termina com a tomada de consciência de que, na fronteira entre o bem e o mal, todos somos a um tempo culpados e inocentes, justos e injustos, almas cinzentas e atormentadas.”
Tenho de voltar a procurar nas livrarias a escrita perfeita, meticulosa, surpreendente, viciante de Philippe Claudel.
Se não a conhece, não sabe o que perde!
Se não a conhece, não sabe o que perde!
(Foto do escritor tirada da net.)
Eu perdedora me confesso. preciso ir ver de philipe Claudel:). Mas já tenho um rol que trouxe da Feira do Livro (este ano em boa hora me excedi). Portanto, não é para já.
ResponderEliminarObrigada pela sugestão, Teresa
Este ano não fui à Feira do Livro. E sinto-me mal, sabes?!
EliminarTento esquecer passeando (e comprando) nas livrarias do shopping aqui da zona. Mas falta-me a luz e beleza do Parque Eduardo VII.
Enfim, a idade faz destas coisas... começo a não saber onde quero estar.
Quanto a Philippe Claudel, hum, não deixes de ler.
Beijo, bom fim-de-semana.
Anotadissimo. Está muito bem classificado no Goodreads. Pena estar esgotado, pois hoje a Wook está com 25% de promoção.
ResponderEliminarOlá, Joaquim!
EliminarSão dois romances excelentes. Se desse para emprestar...
Não consigo entrar no seu blogue.
Abraço, bom fim-de-semana.
OLÁ, feliz regresso e fim de semana.
ResponderEliminarAG
Obrigada, meu amigo António, ainda não passei pelo seu "lugar"...
EliminarBeijo, feliz fim-de-semana.
Há muito tempo que tenho curiosidade de ler a obra este autor francês, até agora, sem ter oportunidade. É pouco conhecido cá na terrinha.
ResponderEliminarBeijo, agradecendo este excelente texto 📚
Eu gosto muito da escrita de Philippe Claudel.
EliminarEstranhamente, esqueço-o nas livrarias, logo, nada leio dele há tempo. (Vou tratar de resolver este "enigma"!)
Nesta postagem podia/devia ter lembrado outro livro que li dele "A neta do senhor Linh", um hino à amizade, solidariedade e compaixão, uma fábula sublime sobre o exílio e a solidão. São 91 páginas inesquecíveis.
Teresa, tens de conhecer este francês escritor e...realizador.
Beijo, bom fim-de-semana.
Querida Teresa
ResponderEliminarPelo que dizes dos livros deste autor fiquei já tomada de uma grande vontade de ler algo dele. E vai ser esse, O Relatório de Brodeck, que me parece tão humano, trazendo ao de cimo sentimentos não muito felizes no que se refere ao relacionamento entre as pessoas.
Bom fim de semana.
Beijos
Olinda
Querida Olinda, se me permites, começa pelo primeiro romance do autor: "Almas cinzentas". É fenomenal!
EliminarDepois, correrás para ler outros. Tenho a certeza!
Beijo, amiga, bom domingo.
Querida Teresa, esse livro de Philippe Claudel em que expõe um crime bárbaro, muitas vezes me levou a pensar na aplicação de uma pena máxima. Monstruosidades, crueldades!Olha só: "Um jovem é acusado da morte da criança e executado, ainda que uma testemunha diga que a viu com o Procurador da terra na noite do crime." E aí se pensa, diante de tamanha pena aplicada, será mesmo o acusado o culpado? E se não for?
ResponderEliminar"A polícia da aldeia investiga e descobre que a verdade é indesejada quando os poderosos da terra estão envolvidos..."
E diante dessa pergunta é que sempre nos leva a pensar o que será o certo. Como deve ser difícil julgar, não?
Beijo, querida amiga.
Bom dia, querida Tais!
EliminarSobre a narrativa nada mais posso divulgar, mas concordo contigo quanto ao acto de julgar. Não deve ser fácil para os juízes.
Mas adianto que rejubilei com esta ficção e com a construção perfeita do carácter da inesquecível personagem/narrador "Brodeck".
Beijo, querida, bom domingo.
Philippe Claudel. Um autor do qual nada li. Gostei da narrativa que fizeste. Fiquei muito curiosa…
ResponderEliminarUm grande beijo.
... sei que vais ler (pelos menos "Almas cinzentas", e gostar!!!
EliminarBeijo, querida Graça.