18 outubro, 2015

"Sinais de fogo" - Jorge de Sena

Sinais de fogo, os homens se despem,
exaustos e tranquilos, destas cinzas frias.
Corria o ano de 1964 quando Jorge de Sena iniciou a escrita de um relato da vida portuguesa no período de 1936 a 1959, tendo por base as experiências de um narrador.
Lamentavelmente, não viveu o tempo necessário para completar tão ambiciosa obra. “Sinais de fogo”, publicado postumamente em 1979, não vai além do verão de 1936.
Geograficamente a história desdobra-se por Lisboa (56 páginas no início, outras tantas no final) e pela Figueira da Foz. O tema central é a adolescência, a descoberta do amor e do sexo, o despertar para a  política. As personagens são muitas e bem construídas.
Jorge, é o narrador do romance. Filho único de uma família da média burguesia de Lisboa, aluno empenhado, um bom amigo. Nas primeiras páginas ele apresenta os amigos Puigmal e Mesquita. Frequentam juntos a faculdade, são colegas desde o 6º ano do liceu. Dos três, Ramos Berenguer de Cabanellas Y Puigmal, é o mais extrovertido, mais endiabrado nas aulas, mais extravagante e…o menos empenhado no estudo. Puigmal vivia num mundo seu, onde não penetravam as ideias dos outros. Mesquita, o bom aluno, era o sempre reeleito chefe de turma, pelo prestígio das suas aventuras amorosas.
Os três eram livres para vagabundear ociosamente ( e disso ele nos dá conta) e só à aproximação dos exames de frequência se fechavam em orgias de estudo contínuo.
A segunda parte do romance começa com Jorge a viajar sózinho para a Figueira da Foz. É usual passar lá os meses de verão, em casa do tio Justino. Lá vai encontrar os amigos de verões anteriores. 
À chegada à estação da Figueira, estranha o comportamento de um grupo de veraneantes espanhóis agitados, aos gritos, a querer regressar rapidamente a Espanha. O que se passa?
Sabe depois, que em Espanha rebentou uma revolução e o seu tio Justino esconde em casa dois espanhóis revolucionários e prepara-lhes a fuga para Espanha.
O verão promete... as férias não se ficarão pelo convívio com os amigos Rodrigues, Rufinho, Ramos, Carlos, nem pela paixão desmesurada por Mercedes, nem pelas «pândegas de arromba».
Sobre estes amigos, diz Jorge: … todos eram meus amigos de Verão, que eu mal conhecia. (…) O não ter-se nada em comum, senão as circunstâncias que nos juntam, é que é a verdadeira sujeição mútua. Muito maior e mais profunda que a que me ligava à família, aos companheiros de sempre, a tudo o que sempre tivera um lugar marcado e habitual na minha vida. Tudo isto não é a nossa vida, mas o pretexto em que nos refugiamos, para não sermos atacados por ela.
No verão de 1936 Jorge vai viver experiências transformadoras ao iniciar-se no amor erótico, nos braços de Mercedes, na poesia, na política. E vai, também, envolver-se em situações absurdas, violentas e perigosas. 
Chegaram os tempos de mudança.
A vida de ninguém estava em condições de continuar a ser uma paz podre. Não seria também uma paz limpa. Era uma guerra, com tudo o que ela implica de podridão e de lixo.
Segue-se o regresso, antecipado, a casa dos pais… era-me estranha, e sê-lo-ia muito mais, depois de tudo o que havia acontecido, mesmo que eu me esquecesse de tudo, e me tornasse perfeitamente indiferente ao que mo lembrasse.
E o refúgio na poesia... porquê e para quê? Porque me sentia completamente só e necessitava de silêncio e, em consequência, precisava de palavras que dissessem não dizendo?

Você também vai necessitar de silêncio para interiorizar esta história.
Aviso que não é fácil de ler. A escrita é complexa e densa. E demasiado descritiva. E demasiado desbragada, em certos momentos. Pare, se necessário, mas não desista. 
Leia até ao fim.. este romance maior.

Jorge Cândido Alves Rodrigues Telles Grilo Raposo de Abreu de Sena foi poeta, crítico, ensaísta, ficcionista, dramaturgo, tradutor e professor universitário.
Nasceu em Lisboa, em 1914 e faleceu na Califórnia, em 1978.

Sinais de fogo, de Jorge de Sena
Edições 70, 1988
526 págs.

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