22 novembro, 2011

Poema de... David Mourão-Ferreira

TERNURA
Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada…

Olho a roupa no chão: que tempestade!
Há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio…

Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo…

Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!

Poema de David Mourão-Ferreira, Portugal (1927-1996)
Pintura (A sesta 1939) de Almada Negreiros,  Portugal (1893-1970)

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