31 janeiro, 2011

Sumário de leituras

 
Li ou reli em Janeiro 2011:
• O poder e a glória, de Graham Greene
• A matéria do poema, de Nuno Júdice
• O tempo entre costuras, de Maria Duenãs
• Homem invisível, de Ralph Elisson
• Obra poética 1948-1988, de David Mourão-Ferreira
• Comer, orar, amar, de Elisabeth Gilbert
• No teu deserto, de Miguel Sousa Tavares
• Ao cair da noite, de Michael Cunningham
• Projecto felicidade, d e Gretchen Rubin

Dou nota máxima:
• O poder e a glória, de Graham Greene
• Homem invisível, de Ralph Elisson

24 janeiro, 2011

"O poder e a glória" - Graham Greene

Comprei este romance no verão de 2010.
Porquê só agora? Não interessa. O que interessa é que o descobri e o li. Nunca é tarde…
Publicado pela primeira vez em 1940, numa modesta edição de 3500 exemplares, foi o livro, em língua inglesa, mais lido no séc. XX e considerado a obra-prima de Graham Greene.
O romance foi escrito após uma viagem do autor ao México, em 1938, nomeadamente às províncias de Tabasco e Chiapas, onde nos anos vinte ocorreu uma das mais ferozes perseguições religiosas.
Outras obras do autor: O Cônsul Honorário, O Americano Tranquilo, Assassino a Soldo, O Nosso Agente em Havana, O Terceiro Homem.

Sinopse: “O livro descreve as peripécias e os dramas do único sacerdote católico que continuava a exercer, clandestinamente, o seu ministério. Perseguido pela polícia, carregava consigo as cicatrizes do tempo: os gestos denunciavam um passado diferente e um temor em relação ao futuro. Não era nem herói nem santo, vivia como fugitivo, cheio de medos, com a consciência de ser um pecador, com o remorso de ter uma filha e, embora debilitado pela bebida, dizia zombeteiramente que com um pouco de conhaque era capaz de desafiar o demónio.
Era um mau sacerdote e sabia disso. Queria fugir, porém, era escravo do seu povo. Era considerado um traidor e qualquer um que o protegesse tornava-se traidor como ele.”

Romance comovente, sobre a perseguição / peregrinação de um padre católico, fraco, cobarde, alcoólico, que foge da polícia e dos fiéis, que tem um segredo, que tem medo da morte, que é humilhado, “que se supunha salvar almas, o que outrora lhe parecera uma coisa muito simples… mas agora parecia um mistério…. tinha consciência da sua própria e desesperada inadequação”, que já não encontra significado na oração, mas continua a exercer o seu ministério.
Genial!

O poder e a glória, de Graham Greene
Casa das Letras, 2010
Tradução de Manuel Cordeiro
247 págs.

"Os melhores contos espirituais do oriente" - Ramiro Calle

Na sequência de várias viagens à Índia e Ásia, Ramiro Calle compilou cerca de mil contos. Destes, seleccionou e traduziu duzentos e cinquenta. Depois, acrescentou a cada conto um breve comentário e divulgou tudo num livro encantador.

O fio condutor dos contos é o despertar da consciência, para nos tornarmos melhores seres humanos.
Aqui fica um, escolhido entre tantos que me marcaram, apenas por ser pequenino:

O riso
“Um monge vivera os últimos anos da sua velhice na mais absoluta paz. Encontrava-se no seu leito, agonizante, e os seus colegas do mosteiro choravam à sua volta. De repente, o monge lançou três sonoras gargalhadas.
- Irmão – sussurravam os monges -, como se pode rir se nós estamos a chorar?
- A primeira gargalhada foi pelo vosso medo da morte; a segunda, porque não estão preparados para enfrentá-la; e a terceira porque eu passo da fadiga ao descanso e vocês, em vez de se alegrarem, andam por aí a choramingar.
Dito isto, fechou os olhos aprazivelmente e expirou.

A morte faz parte da vida. Uma e outra correspondem-se e complementam-se. Não é fácil relacionarmo-nos com a morte e, menos ainda, afrontá-la com equanimidade. Mas a morte pode encarar-se como conselheira e pode ajudar-nos a superar a nossa petulância, os apegos tolos e as mesquinhices."

Este é um livro para colocar num lugar bem visível da nossa estante.
Porquê? Para nos socorrer quando necessitarmos de "alimento" para a mente e para o coração.

Os Melhores Contos Espirituais do Oriente, de Ramiro Calle
A esfera dos livros, 2006
Tradução de Margarida Cardoso de Meneses
430 págs

17 janeiro, 2011

"Obra poética I" - Sophia de Mello Breyner Andresen

O mar é um dos grandes temas da obra poética de Sophia de Mello Breyner Andresen.
Seleccionei três poemas. Descubram muitos mais.

PRAIA
As ondas desenrolam os seus braços
E brancas tombam de bruços.

MEIO-DIA
Meio-dia. Um canto da praia sem ninguém.
O sol no alto, fundo, enorme, aberto,
Tornou o céu de todo o deus deserto.
A luz cai implacável como um castigo,
Não há fantasmas nem almas,
E o mar imenso, solitário e antigo,
Parece bater palmas.


MAR SONORO
Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.

"Três mulheres poderosas" - Marie Ndiaye

Foi por mera curiosidade que comprei e li "Três mulheres poderosas" no verão passado, depois de saber que estava a ser um fenómeno literário em França e do prémio que havia conquistado. Não conhecia nada da obra da autora.
Não me arrependi, pois deliciei-me com um retrato riquíssimo, impecável, duro, doce, de comportamentos, sentimentos e relações humanas.

“Três mulheres poderosas”, Prémio Goncourt 2009, pela primeira vez atribuído a uma escritora negra, conta a história de três mulheres – Norah, Fanta e Khady Demba, que para preservarem a dignidade face às humilhações que a vida lhes inflige, tiveram de aprender a dizer NÃO.
A ligá-las: a África, a França, o drama das migrações e a difícil integração.

A primeira história, a que mais me tocou, é o relato da resposta de Norah, 38 anos, ao chamamento do pai “…muito me honrarias e dar-me-ias um insigne prazer se não te importasses, e se as tuas forças te permitirem, de te separar da tua família durante um período mais ou menos longo, para vires a minha casa, a casa do teu pai, pois tenho de te falar de coisas graves e importantes…”
Mesmo pensando “não faz sentido e não há qualquer interesse em ter como pai um homem com o qual não é literalmente possível entender-se e cujo afecto foi sempre improvável”… ela foi ter com aquele pai que abandonara, em França, a mulher e duas filhas, com 8 e 9 anos, e fugira para África com o filho Sony.
Mas “aquele homem terrível, intratável” agora sozinho, dobrado sobre o peso da idade, da doença e do desgosto, era o seu pai. O que se passou para a chamar?
A terceira história, a que mais me abalou, relata o drama da jovem Khady, que depois da morte inesperada do marido foi desprezada e abandonada pela família dele. A partir daí, começou o seu inferno.

Três mulheres poderosas, de Marie Ndiaye
Teorema, 2010
Tradução de Carlos Correia Monteiro de Oliveira
296 págs.

"O tempo entre costuras" - María Duenãs


Sinopse: O tempo entre costuras” é a história de Sira Quiroga, uma jovem modista empurrada pelo destino para um arriscado compromisso. Sem aviso, os pespontos e alinhavos do seu ofício convertem-se na fachada para missões obscuras que a enleiam num mundo de glamour e paixões, riqueza e miséria, mas também de vitórias e derrotas, de conspirações históricas e políticas, de espias.
Um romance de ritmo imparável, costurado de encontros e desencontros, que nos transporta, em descrições fiéis pelos cenários de uma Madrid pró-Alemanha, dos enclaves de Tânger e Tetuán e de uma Lisboa cosmopolita repleta de oportunistas e refugiados sem rumo.”

Grande sucesso da literatura espanhola de 2009, de autora desconhecida, estreante na ficção, centra a acção no período entre a Guerra Civil Espanhola e a II Guerra Mundial e a trama é cheia de reviravoltas, romance, traição, drama e suspense.
A primeira frase do romance “uma máquina de escrever arruinou o meu destino” alerta-nos para a reviravolta que se irá seguir. E que reviravolta.
Sira, a personagem principal e narradora, é uma jovem que cresceu num bairro pobre de Madrid, segue a profissão da mãe (modista) e está noiva de um rapaz simples mas generoso.
Seduzida pelo vendedor da máquina de escrever, abandona tudo e foge com ele para Marrocos. Ali, é ele que a abandona, a rouba, a deixa cravada de dívidas.
Impossibilitada de regressar a Espanha, refaz a vida em Tetuán, torna-se uma modista de sucesso e paga todas as dívidas.
Tudo corre bem, até que uma das suas clientes, uma inglesa que se tornará a maior amiga, lhe faz uma estranha proposta: voltar a Madrid, costurar para as mulheres dos altos cargos nazis e espiar para os serviços secretos britânicos.

Não gostei nem desgostei do que li. Simplesmente, considero que este livro não irá ficar por muito tempo na minha memória.
Já me aconteceu com outros livros e certamente voltará a acontecer.

O tempo entre costuras, de María Dueñas
Porto Editora, 2010
Tradução de Carlos Romão
632 págs.

12 janeiro, 2011

"O meu livro do chocolate"

Como na vida nem tudo é amargo, muito menos sério, deliciei-me a saborear com o olhar mais de oitenta receitas em que o ingrediente principal é o chocolate.
Todos sabemos que o chocolate promove uma sensação de bem-estar e que basta um quadradinho para alegrar um dia mau. Vamos experimentar, então, estas óptimas receitas.
Bom apetite!

10 janeiro, 2011

"Homem invisível" - Ralph Ellison

Sinopse: “Invisível para os brancos racistas, para os brancos emancipados, e para os próprios negros radicais, o protagonista desta obra deseja apenas ser como é. E não como realmente acontece, ou seja, um “homem invisível”, já que realmente todos vêem o que o rodeia e não a ele próprio.
Homem Invisível revela a dor da existência do homem negro num mundo branco. É a história da viagem de um jovem negro pelos estados sulistas da América nos primeiros anos do século XX. Com o passar do tempo, entre experiências frequentemente contraditórias, o protagonista fica a conhecer o mundo dos negros, o mundo dos brancos e o seu próprio mundo. Trata-se de uma peregrinação excepcionalmente esclarecedora sobre questões fundamentais como a raça, a existência humana ou os ideais democráticos.”

Num texto muito bem organizado, muito bem escrito, o narrador, sempre incógnito, transporta-nos ao passado e, a partir daí, tece o enredo: excelente aluno, frequenta uma universidade para negros, que para ele era o melhor dos mundos possíveis, e pretende ficar na universidade como professor ou como membro do conselho administrativo. Devido a uma falta considerada muito grave, cometida no âmbito das severas regras de comportamento, foi expulso. O reitor entrega-lhe várias cartas de recomendação para administradores que o poderão ajudar na procura de emprego. Mas a mensagem nelas contida….

Primeiro romance de um autor desconhecido, provocou intensa polémica aquando da sua publicação, em 1952. Posteriormente foi considerado pela crítica uma obra-prima e reconhecido por muitos como a melhor obra afro-americana de sempre.

Frases que escolho: “Demorei muito tempo e muitas reviravoltas dolorosas das minhas expectativas até atingir um resultado que a todos parecia evidente: que não sou ninguém a não ser eu próprio. Mas primeiro tive de descobrir que sou um homem invisível!!. E, contudo, não sou nenhuma aberração da natureza nem da história. Não me envergonho de os meus avós terem sido escravos. Só me envergonho de mim próprio por em certa altura me ter envergonhado.” (pág. 19)

Homem invisível, de Ralph Ellison
Casa das Letras, 2006
Tradução de Salvato Telles de Menezes e Rui Andrade
470 págs.