Sinopse: A crescer numa pequena fazenda no Brasil, o jovem André ama a terra e desafia os sermões do pai em virtude dos sentimentos pela irmã Ana. Dividido entre o afecto desmedido da mãe e a severa autoridade do pai, André tem de escolher entre cumprir o destino do filho pródigo ou ser a ovelha tresmalhada. Confrontado entre o corpo e a alma, entre o dever filial e a liberdade, a única saída é deixar a casa da família.
… o amor na família pode não ter a grandeza que se imagina…
“Lavoura arcaica” é uma belíssima e comovente história de família.
Retrato íntimo, duro e dramático do quotidiano entre as quatro paredes do lar, onde não falta afecto, amor, sofrimento, revolta, silêncios, confissões impossíveis, revelações incómodas.
A família é a do jovem André, o filho arredio, acometido, revoltado, tresmalhado; revoltado com a agressividade, austeridade e excessiva disciplina do progenitor; enfastiado das homilias contra as tentações e dos sermões do pai à cabeceira da mesa.
"Meu pai sempre dizia que o sofrimento melhora o homem, desenvolvendo o seu espírito e aprimorando a sua sensibilidade; ele dava a entender que quanto maior fosse a dor tanto ainda o sofrimento cumpria sua função mais nobre; ele parecia acreditar que a resistência de um homem era inesgotável; que o mundo das paixões é o mundo do desequilíbrio; é através do recolhimento que escapamos ao perigo das paixões mas ninguém no seu entendimento há de achar que devamos sempre cruzar os braços, pois em terras ociosas é que viceja a erva daninha: ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a terra para lavrar, ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a parede para erguer, ninguém ainda em nossa casa há de cruzar os braços quando existe o irmão para socorrer."
André deixa a casa da família (1ª parte do romance) para conhecer mundo. No coração leva o afecto desmedido da mãe e o amor -milagre que viveu com Ana.
“Ana, me escute, é só o que te peço (…) foi um milagre o que aconteceu entre nós, querida irmã; foi um milagre descobrirmos acima de tudo que nos bastamos dentro dos limites da nossa própria casa, confirmando a palavra do pai de que a felicidade só pode ser encontrada no seio da família.”
André acabou por ser encontrado por Pedro, o irmão mais velho, e convencido a voltar para junto da família. A "ovelha tresmalhada" retorna a casa (2ª parte do romance) para confrontar o pai.
"- Ninguém vive só de semear, pai.
- Claro que não, meu filho; se outros hão de colher do que semeamos hoje, estamos colhendo por outro lado do que semearam antes de nós. É assim que o mundo caminha, é esta a corrente da vida.
- Isso já não me encanta, sei hoje do que é capaz esta corrente; os que semeiam e não colhem, colhem contudo do que não plantaram; deste legado, pai, não tive o meu bocado. Por que empurrar o mundo para a frente? Se já tenho as mãos atadas, não vou por minha iniciativa atar meus pés também; por isso, pouco me importa o rumo que os ventos tomem…
- É muito estranho o que estou ouvindo.
- Estranho é o mundo, pai, que só se une se desunindo;"
(pobre família nossa, prisioneira de fantasmas tão consistentes!)
É triste o fim desta assombrosa história. Mas sobre isso, nada desvendo.
“Lavoura arcaica” - a parábola do filho pródigo, invertida - não é para ser contada, mas lida.
Se ainda não conhece, corra a uma livraria, procure, compre, leia.
Eu, li-o de uma assentada, cativa da inteligência e sensibilidade da linguagem do escritor. Nem os enormes parágrafos derramados em duas, três, quatro páginas seguidas me fizeram desistir desta fascinante e bem contada história. Acreditem, penetrar na intimidade da família do André foi uma experiência inesquecível.
Lavoura arcaica, de Raduan Nassar
Companhia das Letras, 2016
175 págs.
Raduan Nassar, filho de emigrantes libaneses, nasceu em 1935 em Pindorama, no interior do estado de S. Paulo, Brasil.
Estudou Direito e Filosofia.
Nos anos sessenta escreveu o seu primeiro conto "Menina a Caminho"; viajou pelo Canadá e Estados Unidos. Regressou ao Brasil em 1962 e terminou o curso de Filosofia. Dois anos depois viajou para a Alemanha, onde estudou alemão. Visitou a aldeia dos pais, no Líbano.
Nos anos setenta publicou três livros: o romance "Lavoura Arcaica" (1975), a novela “Um copo de cólera" (1978) e o livro de contos "Menina a caminho" (1997).
Visitou Portugal em 1974, pouco após a revolução de Abril.
Nos anos oitenta, já com algum sucesso editorial no Brasil e no estrangeiro, abandonou a literatura e retirou-se para a sua fazenda, para se dedicar à criação de galinhas e coelhos.
Em 2011 distribuiu as terras pelos seus funcionários, doou a fazenda à Universidade Federal de S. Carlos e foi morar para S. Paulo.
Em 2016, foi-lhe atribuído, por unanimidade, o Prémio Camões, o mais importante prémio literário destinado a autores de língua portuguesa.
… o amor na família pode não ter a grandeza que se imagina…
“Lavoura arcaica” é uma belíssima e comovente história de família.
Retrato íntimo, duro e dramático do quotidiano entre as quatro paredes do lar, onde não falta afecto, amor, sofrimento, revolta, silêncios, confissões impossíveis, revelações incómodas.
A família é a do jovem André, o filho arredio, acometido, revoltado, tresmalhado; revoltado com a agressividade, austeridade e excessiva disciplina do progenitor; enfastiado das homilias contra as tentações e dos sermões do pai à cabeceira da mesa.
"Meu pai sempre dizia que o sofrimento melhora o homem, desenvolvendo o seu espírito e aprimorando a sua sensibilidade; ele dava a entender que quanto maior fosse a dor tanto ainda o sofrimento cumpria sua função mais nobre; ele parecia acreditar que a resistência de um homem era inesgotável; que o mundo das paixões é o mundo do desequilíbrio; é através do recolhimento que escapamos ao perigo das paixões mas ninguém no seu entendimento há de achar que devamos sempre cruzar os braços, pois em terras ociosas é que viceja a erva daninha: ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a terra para lavrar, ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a parede para erguer, ninguém ainda em nossa casa há de cruzar os braços quando existe o irmão para socorrer."
André deixa a casa da família (1ª parte do romance) para conhecer mundo. No coração leva o afecto desmedido da mãe e o amor -milagre que viveu com Ana.
“Ana, me escute, é só o que te peço (…) foi um milagre o que aconteceu entre nós, querida irmã; foi um milagre descobrirmos acima de tudo que nos bastamos dentro dos limites da nossa própria casa, confirmando a palavra do pai de que a felicidade só pode ser encontrada no seio da família.”
André acabou por ser encontrado por Pedro, o irmão mais velho, e convencido a voltar para junto da família. A "ovelha tresmalhada" retorna a casa (2ª parte do romance) para confrontar o pai.
"- Ninguém vive só de semear, pai.
- Claro que não, meu filho; se outros hão de colher do que semeamos hoje, estamos colhendo por outro lado do que semearam antes de nós. É assim que o mundo caminha, é esta a corrente da vida.
- Isso já não me encanta, sei hoje do que é capaz esta corrente; os que semeiam e não colhem, colhem contudo do que não plantaram; deste legado, pai, não tive o meu bocado. Por que empurrar o mundo para a frente? Se já tenho as mãos atadas, não vou por minha iniciativa atar meus pés também; por isso, pouco me importa o rumo que os ventos tomem…
- É muito estranho o que estou ouvindo.
- Estranho é o mundo, pai, que só se une se desunindo;"
(pobre família nossa, prisioneira de fantasmas tão consistentes!)
É triste o fim desta assombrosa história. Mas sobre isso, nada desvendo.
“Lavoura arcaica” - a parábola do filho pródigo, invertida - não é para ser contada, mas lida.
Se ainda não conhece, corra a uma livraria, procure, compre, leia.
Eu, li-o de uma assentada, cativa da inteligência e sensibilidade da linguagem do escritor. Nem os enormes parágrafos derramados em duas, três, quatro páginas seguidas me fizeram desistir desta fascinante e bem contada história. Acreditem, penetrar na intimidade da família do André foi uma experiência inesquecível.
Lavoura arcaica, de Raduan Nassar
Companhia das Letras, 2016
175 págs.
Raduan Nassar, filho de emigrantes libaneses, nasceu em 1935 em Pindorama, no interior do estado de S. Paulo, Brasil.
Estudou Direito e Filosofia.
Nos anos sessenta escreveu o seu primeiro conto "Menina a Caminho"; viajou pelo Canadá e Estados Unidos. Regressou ao Brasil em 1962 e terminou o curso de Filosofia. Dois anos depois viajou para a Alemanha, onde estudou alemão. Visitou a aldeia dos pais, no Líbano.
Nos anos setenta publicou três livros: o romance "Lavoura Arcaica" (1975), a novela “Um copo de cólera" (1978) e o livro de contos "Menina a caminho" (1997).
Visitou Portugal em 1974, pouco após a revolução de Abril.
Nos anos oitenta, já com algum sucesso editorial no Brasil e no estrangeiro, abandonou a literatura e retirou-se para a sua fazenda, para se dedicar à criação de galinhas e coelhos.
Em 2011 distribuiu as terras pelos seus funcionários, doou a fazenda à Universidade Federal de S. Carlos e foi morar para S. Paulo.
Em 2016, foi-lhe atribuído, por unanimidade, o Prémio Camões, o mais importante prémio literário destinado a autores de língua portuguesa.
Vou levar a sugestão de leitura!!!
ResponderEliminarGracinha, lê que vais gostar.
EliminarÉ uma história de vida comovente, muito bem contada.
Bjs.
O livro é sempre uma escada
ResponderEliminarA ter do alto a visão
De algo novo ou então,
Rever obra e relembrada
Trilhar novamente a estrada
Palmilhada e ter noção
Não palmilhar toda, não
Como viu. Há encruzilhada,
Há desvio não percebido
Que muda todo o sentido
Da distância e do caminho.
Lembro não ter dado ouvido
Ao meu avô querido:
"Leia com amor e carinho!"
Ler é maravilhoso. Gostei da sinopse. Esse autor é realmente muito bom. Parabéns pela maravilhosa postagem! Abraços. Laerte.
Olá Laerte!
EliminarPrimeiro, obrigada por partilhares no meu roldeleituras versos tão belos.
Segundo, concordo a cem por cento com o conselho do teu avô (dou o mesmo à minha neta, e espero que ela me oiça).
Terceiro, repito com letras maiúsculas: LER É MARAVILHOSO! Ler é o melhor alimento para a mente e para a alma.
Abraço, Laerte e obrigada por passares por aqui.
ResponderEliminarTeresa, tenho aqui, além do Lavoura Arcaica, 'Cadernos de Literatura Brasileira', dedicado a Raduan Nassar, uma enorme entrevista com ele, fala de seus livros etc. Mas uma coisa encucou a muitos: o que levou esse escritor a desistir de tudo no auge do sucesso?
"Quanto ao fato de Raduan Nassar ter deixado de escrever, ainda tão jovem, e depois de ter publicado com sucesso um romance e uma novela, obras que deram novo fôlego à literatura brasileira – dois livros ontológicos - muitas perguntas tem sido feitas por escritores, leitores e críticos literários, ao longo dos anos, sobre os motivos que levaram Raduan a deixar de escrever. O próprio Raduan nunca chegou a esclarecer de forma convincente por que tomara essa decisão. Aliás, ele diz não saber como tudo terminou.
Para Raduan Nassar, o capítulo menos atraente da literatura sempre foi o do burburinho literário – noites de autógrafos, debates, assédio da imprensa. Resultado: ele jamais admitiu autografar suas obras em festas de lançamento, não hesitou em comparecer a um encontro de escritores na França só para dizer à platéia que nada tinha a declarar e descobriu um modo educado de falar aos jornalistas que pode recebê-los, sim, a qualquer hora, desde que a conversa não gire em torno de literatura ou tema afins. Não é de estranhar, portanto, que sejam raras as entrevistas dadas por Raduan.”
Beijo! (veja o filme Lavoura Arcaica!)
Tais, eu “conheci “ Raduan Nassar no exacto dia em que lhe foi atribuído o Prémio Camões 2016.
EliminarNa altura achei estranho galardoar um escritor com obra pouca (três livros publicados, em 1975, 1978, 1997), que no auge da carreira trocou a literatura pela agricultura.
Agora que li o seu primeiro romance e fiquei encantada com a qualidade da sua escrita cativante e envolvente, também me interrogo sobre as razões de tão estranha decisão: pressão mediática; exigências editoriais; medo do sucesso; perda da capacidade imaginativa; desejo de uma nova forma de vida; motivos familiares?
Amiga, o "enigma Nassar" não consigo decifrar mas os três livros escritos pelo senhor vou mesmo ler. E tentar ver o filme de que falas.
Beijo.
Ainda não li, pelo que postei da apresentação.
ResponderEliminarContinuação de dias felizes, com leituras muito agradáveis.
Beijinhos, Teresa.
~~~~
Quis dizer, ''gostei da apresentação''
EliminarNão sei o que aconteceu à página sobre
Florbela Espanca...
Beijinho.
Fugiu mas voltará...
EliminarBeijo e bom domingo.
Pelo que aqui ficou escrito, deixou-me interessada. Mas já quando o escritor ganhou o prémio me interessou por saber que tinha escrito pouco e abandonado para se dedicar à agricultura. Desconhecia que tivesse doado as suas terras. Parece-me uma figura que vale a pena. E julgo entendê-lo.
ResponderEliminarBom dia, é uma historia sempre actual no tempo, Raduan Nassa soube na perfeição explorar a realidade dos pais que querem passar bons valores ao filhos sem se aperceberem que estagnaram no tempo, cada geração tem uma mentalidade diferente da outra, não significa que sejam menos responsáveis ou que tenham menos capacidade que o pai.
ResponderEliminarAG
Palavras certeiras, António!
ResponderEliminarAbraço.
Vou com certeza ler o livro; familia é um tema que aprecio e por outro lado já tinha pensado em comprar mais livros, pois, por incrivel que pareça, leio mais no verão que no inverno; como não gosto de praia enquanto ficam na areia eu sento-me num café e leio; enquanto estive no Brasil, à noite, depois que deixava a casa dos meus pais li 3 livros e já estava a pensar no próximo. Já cá está ele amiga! Muito obrigada, Teresa, também por teres avivado a minha memória, pois já não me lembrava que este senhor tinha sido galardoado combo prémio Camões. Beijinhos e um bom Domigo
ResponderEliminarEmilia
Olá Emília!
EliminarGostei de saber que esta postagem te estimulou a ler este romance.
Não é um livro fácil, mas a sensibilidade que pões em tudo o que escreves, dá-me a certeza de que vais "amar".
Beijo e bom domingo.