O grande homem é aquele que reconhece quando e em que é pequeno. O homem pequeno é aquele que não reconhece a sua pequenez e teme reconhecê-la.
Pensas sempre a curto prazo, Zé Ninguém, o teu tempo medeia de uma refeição a outra. Terás de aprender a memória em termos de séculos, e a perspectiva do futuro em termos de milénios. Terás de aprendê-la em termos da verdadeira vida, em termos do teu desenvolvimento desde o primeiro foco plasmático até ao animal humano, capaz de caminhar erecto, mas incapaz ainda de pensar com justeza. Porque a tua memória não retém acontecimentos de há dez ou vinte anos, continuas repetindo as mesmas asneiras de há dois milénios. E mais ainda: agarras-te a elas – à tua «raça», «classe», «nação», aos teus ritos religiosos compulsivos, à supressão do amor, como um piolho se aferra à pele. Nem te atreves a ver até que ponto te encontras atolado na tua miséria. De vez em quando, deitas a cabeça de fora e berras «Viva!» O coaxar de uma rã no charco tem pelo menos mais sentido. (…)
Quando saberás viver a tua vida em paz e segurança; a resposta consiste no inverso da tua forma de ser actual: viverás bem e em paz quando a vida significar para ti mais do que a segurança; o amor mais do que o dinheiro; a tua liberdade mais do que as linhas directivas do partido ou a opinião pública; quando o modo de estar no mundo de um Beethoven ou de um Bach for o tom habitual de toda a tua existência. (…)
Troca as tuas ilusões por um pouco de verdade.
Protege o amor das crianças de tenra idade dos ataques de adultos lascivos e frustrados.
Não tentes ser mais explorador que quem tenta explorar-te.
Não tentes melhorar a natureza mas antes entendê-la.
Procura pensar correctamente, ouve a tua voz interior e o seu murmúrio brando. Tens a vida nas tuas mãos. Sê tu próprio.
E não consintas que o sofrimento te torne duro e amargo.”
Tirei daqui: “Escuta, Zé Ninguém!” (1945), de Wilhelm Reich (1897-1957), médico psicanalista e cientista austro-húngaro, pensador inconformista e autenticamente progressista, discípulo dissidente de Sigmund Freud.
Pintura "Cabeça", do pintor russo Pavel Filonov (1883-1941)
Adorei sua partilha pois o texto é bem pertinente e sempre atual!
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ResponderEliminarMuito bom, Teresa, ter encontrado esta sua postagem, "Escuta, Zé Ninguém!", cujo autor é um dos escritores que há muito admiro, Wilhelm Reich. Conheci trabalhos de Reich quando lia muito psicanálise. Lia Freud, Anna Freud, Melanie Klein Wilhelm Stekel, Carl Jung, entre outros, quando estava na Universidade. Nunca me desliguei dessas leituras.
Um abraço.
Uma mensagem muito bonita e verdadeira.
ResponderEliminarAdorei o título, já fez minha cabeça! Adoro coisas do gênero, mergulho nelas.
ResponderEliminar"Procura pensar correctamente, ouve a tua voz interior e o seu murmúrio brando. Tens a vida nas tuas mãos. Sê tu próprio.
E não consintas que o sofrimento te torne duro e amargo".
Pensar, não seguir nem aceitar interferências é algo a pensar muito. Certas pessoas metidas, querendo dar seus pitacos, facilmente podem desestabilizar aos menos avisados. Por isso é bom estar em alerta, tipo perdigueiro... me entendes, não, amiga?
Gostei muito!
Beijo!
Bem inspirador, um grito de liberdade. Abraços.
ResponderEliminarUm texto muito interessante.
ResponderEliminarObrigado pela partilha.
Bom fim de semana, amiga Teresa.
Abraço.