"A memória é como o chão de uma casa, de uma casa de madeira, há tábuas que vão ficando podres, embora já estejam a esboroar-se parecem iguais às outras todas, está-se seguro, continua-se a andar, mas, de repente, há qualquer coisa que desaparece, desaparece e já não se pode alcançá-la, há uma tábua que cede e todas as coisas que estavam à sua volta são como que sorvidas. Quanto mais os anos vão passando, mais os abismos aumentam, só há turbilhões a girar, uma pessoa anda cada vez com mais cautela por entre esses sorvedouros, basta o mais pequeno erro para que o pouco que ainda conserva vá parar lá dentro.
É a escuridão, não é? É a escuridão, mas continua-se a viver, e o mais tremendo, o que mais enraivece, é que o coração e a barriga continuam a funcionar, podendo continuar a funcionar durante anos e anos, quando uma pessoa já deixou de existir.”
Tirei daqui: “Para uma voz só”, de Susanna Tamaro, Ed. Presença, 1997
Foto da net.
Gostei da citação e também gostei do único livro que li da escritora. Não sei porque é que não voltei a ler nada dela - provavelmente, não calhou! ;)
ResponderEliminarBeijinhos
Não desgosto desta escritora que já alguém me disse que é boa para criadas de servir. Estou-me pouco lixando. Eu gostei do que li. Penso que tem uma obsessão com a velhice, mas dou-lhe razão. O mecanismo da mente, até como o resto do corpo, age à traição. O que foi deixa de ser. Não há regresso. Vamo-nos perdendo de nós.
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