08 julho, 2011

"A questão Finkler" - Howard Jacobson

Embora se queixassem de, sem uma companheira, não terem norte nem propósito, os três homens – os dois viúvos e Treslove, que tinha o estatuto de membro honorário – desfrutavam da companhia uns dos outros, discutiam sobre economia, evocavam piadas e episódios caricatos do passado e quase conseguiam convencer-se de que tinham regressado ao tempo em que ainda não tinham esposas para perder.
Este desalmado sofrimento lutuoso era o motivo pelo qual os três se encontravam agora mais do que o haviam feito em trinta anos.
Com as esposas desaparecidas, podiam ser jovens de novo.
São três estes amigos: Sam Finkler, Libor Sevcik e Julian Treslove, o personagem principal deste romance de Howard Jacobson, vencedor do Man Booker Prize 2010.
Treslove, 49 anos,“nascera para sofrer desastres e desgostos”. Com uma personalidade obsessiva, nunca casou mas tem dois filhos adultos de mães diferentes, desistiu de uma carreira no mundo das artes e colecciona empregos inadequados e mulheres igualmente inadequadas.
Contrariamente aos amigos que choravam as mulheres amadas, Treslove era abandonado pelas mulheres mas “não conseguia chorar por elas. E, se não conseguia chorar, não conseguia amar.”
No regresso a casa, depois de um dos habituais jantares melancólicos com os amigos, Treslove foi assaltado por uma mulher que lhe chamou judeu. Será que chamou, ou ele imaginou?
“Para um homem cuja vida fora uma colecção de desgraças absurdas, uma a seguir à outra, o acontecimento era seguramente o cume da ignomínia”. Desencantado com a vida, a partir deste assalto o seu sentido de identidade transformou-se radicalmente: quer ser judeu. Judeu, como o amigo de infância que sempre invejou Sam Finkler, viúvo de um casamento feliz, homem de sucesso, autor de livros de auto-ajuda sobre filosofia prática e que… detesta o judaísmo e evita a companhia de judeus.
Numa linguagem divertida e ao mesmo tempo mordaz, o autor escreve de forma brilhante sobre temas sérios, como o luto, a amizade, o amor, a família, a traição, a solidão, a inveja, a memória, a cultura judaica, o anti-semitismo e o Holocausto.
A primeira parte do livro é hilariante e inteligente. A leitura é compulsiva.
A segunda parte tem um tom mais sério, apesar de alguns episódios divertidos, e por vezes sentimos que o autor perde um pouco o controlo da acção. A leitura é maçadora.
Treslove acreditava estar destinado a ser feliz – ou infeliz: não importava qual dos dois, desde que estivesse destinado.
Fim de assunto, como diziam os seus filhos.
 
 
A questão Finkler, de Howard Jacobson
Porto Editora, 2011
Tradução de Alcinda Marinho
372 págs.

7 comentários:

  1. Gostava de ler este livro, parece-me ser interessante

    Boas leituras

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  2. Olá Maria,
    Lê que vais gostar.
    Este livro "mexeu" comigo, e creio que acontecerá o mesmo a todas as mulheres, de uma forma especial.
    Fico a aguardar a tua opinião.
    Bjs.

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  3. O judaísmo e as suas causas é um tema abordado por vários autores, na minha opinião Howard Jacobson fá-lo de uma forma exaustiva, é quanto a mim esse facto de torna o livro um pouco maçudo. Contudo, a obra é uma excelente analise sobre tudo o que esta relacionado com o judaísmo, tanto passadas como futura, mas para ser sincero espera mais de um Man Booker Prize, por exemplo, além de uma das personagens ser um filosofo (Finker), não são dadas soluções para muitos dos problemas do judaísmo.

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  4. Olá Tiago,
    Para mim o autor utiliza o humor para abordar o judaísmo e fá-lo de forma magnífica.
    Soluções para os problemas judaicos? Penso que não cabe ao autor indicá-las no romance.
    É a minha opinião, claro.

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  5. Bom dia Teresa,
    Uma das grandes vantagens na Net, e dos blogs mais especificamente, é que podemos trocar ideias. No caso da literatura, por vezes era difícil arranjar pessoas que tivessem lido as mesmas obras que nós, por isso por vezes ficávamos só com o nosso ponto de vista relativamente á obra, o que quanto a mim não é muito benéfico (quantas vezes mudamos de opinião após veres que o nosso ponto de vista não era o mais correcto). Hoje a Net tem essa grande vantagem.
    No meu ponto de vista, ou melhor, o meu pensamento hoje relativamente á obra, é Jacobson dá-nos a conhecer quais foram os problemas dos judeus, os seus costumes, os problemas actuais, até fala dos palestinianos, e também revela-nos preocupações sobre o futuro, mas por exemplo, em Estrela Errante de J.M. le Clezio, (livro que ambos lê-mos) além de não serem apresentadas nenhumas medidas concretas para resolver o problema Israel/Palestiniano, no final da obra, ficamos com a certeza que enquanto os Israelitas tratarem os palestinianos um pouco como nós europeus os tratamos, obrigando-os a fugir da Europa, o conflito nunca será resolvido. É este tipo de pensamento, adequado ao tema deste livro que é bem diferente do de Clezio, que eu acho que falta na obra.

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  6. Bom dia Teresa,

    Quando acabei de ler este livro, achei que o autor tinha exagerado relativamente aos problemas que poderiam causar o fanatismo religioso. Sabia que infelizmente ainda há bastante fanatismo religioso por todo o mundo, mas nunca pensei que no "velho continente" pode-se chegar ao ponto que chegou.
    Infelizmente os recentes atentados na Noruega mostram que o autor tinha razão.

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  7. Olá Tiago,
    Tenho de concordar consigo.
    O que se passou foi monstruoso e abalou profundamente a Noruega e o "velho continente". Pelo número de vítimas e por ter sido cometido por um dos seus - fanático mas europeu. Ainda "dói" mais, não é?

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