Buenos Aires, cuando lejos me vi.
Bruno Cadogan, protagonista e narrador deste fascinante romance, doutorado em Letras pela Universidade de Nova Iorque, escrevia uma dissertação sobre os ensaios que Jorge Luis Borges dedicou às origens do tango. Um dos professores aconselha-o a viajar para Buenos Aires. Cadogan não considera necessário.
Até que… Jean Franco, especialista em Borges, lhe diz que em Buenos Aires “há um tipo extraordinário que canta tangos muito antigos… nunca gravou uma única estrofe, não quer mediadores entre a sua voz e o público. Tens de ouvi-lo. É melhor que Gardel.”
É Júlio Martel.
Em Setembro de 2001 Cadogan viaja para Buenos Aires. Encontra uma cidade à beira do caos económico, majestosa e ao mesmo tempo ruinosa, que mantém intacta a beleza de um passado esplendoroso.
Com a ajuda de Tucumano, um jovem que conhece no aeroporto, consegue hospedar-se no edifício onde Borges localiza a acção do seu celebrado conto “O Aleph” e inicia a investigação sobre o misterioso cantor Martel.
Em busca de respostas, passeia por enormes e frondosas avenidas e bairros labirínticos, e surpreende-se com os inúmeros e hospitaleiros cafés, abertos a toda a hora, cheios de gente que lê durante muito tempo diante de uma chávena vazia, sem que os obriguem a pagar a conta e a retirar-se.
Pensei que esses cafés eram perfeitos para escrever romances. Ali a realidade não sabia o que fazer e andava solta, à caça de autores que se atrevessem a contá-la.
Também se apercebe de que as livrarias estão cheias de gente que não compra livros.
Começam um livro numa qualquer livraria e continuam a lê-lo noutra, de dez em dez páginas ou de capítulo em capítulo, até terminarem.
Mas, voltando ao objecto da sua dissertação, quem é afinal Júlio Martel? Onde actua?
É num clube de dança, que Cadogan encontra as primeiras respostas.
Júlio Martel nasceu em 1945, hemofílico, “desenvolveu um tronco enorme, desproporcional em relação às pernas raquíticas. Não podia ir à escola. Aprendeu a ler fluentemente com professores particulares. Aos onze, doze anos, passava as horas a ouvir tangos no rádio. Aos quinze anos, fechava-se na casa de banho e soltava uma voz intensa e doce de soprano”.
A voz dele fugia a qualquer descrição, porque ela própria era o relato da Buenos Aires passada e da que viria.
Quer vê-lo, ouvi-lo, mas onde? As suas actuações eram insólitas e esporádicas.
Começa a averiguar os sítios onde Martel actua, tentando descobrir se estavam ligados por alguma ordem ou desígnio. Talvez isso lhe permitisse antecipar a próxima aparição num enigmático labirinto do passado da cidade e escutar aquela voz única.
Conseguirá ele assistir a algumas das suas actuações?
O cantor de tango, de Tomás Eloy Martínez
Edições ASA, 2008
Tradução de Helena Pitta
186 págs.
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