Luanda corre a toda a velocidade em direcção ao Grande Desastre. Oito milhões de pessoas aos uivos, aos choros e às gargalhadas. Uma festa. Uma tragédia. Tudo o que pode acontecer acontece aqui. O que não pode acontecer, acontece igualmente. (...) Somos incrivelmente ricos. Produzimos metade dos diamantes vendidos no mundo. Temos ouro, cobre, minerais raros, florestas por explorar e água que não acaba mais. Morremos de fome, de malária, de cólera, de diarreia, de doença do sono, de vírus vindos do futuro, uns, e outros de um passado sem nome.
Em “Barroco tropical” (2009) José Eduardo Agualusa tece um retrato sarcástico da sociedade angolana, de Luanda em particular, no ano 2020.
Em “Barroco tropical” (2009) José Eduardo Agualusa tece um retrato sarcástico da sociedade angolana, de Luanda em particular, no ano 2020.
A história/testemunho começa com uma mulher nua, negra, de braços abertos a cair do céu de Luanda, durante uma tempestade tropical. As únicas testemunhas do insólito facto são Bartolomeu Falcato (escritor e cineasta), e a sua amante Kianda (cantora com uma carreira internacional de sucesso), os narradores-protagonistas de uma sinuosa trama.
Bartolomeu aproxima-se do corpo enterrado na lama e reconhece Núbia, a modelo, jornalista, ex-Miss Angola, amiga da mulher do Presidente, acompanhante de políticos influentes e empresários endinheirados, com quem viajou de Lisboa para Luanda, cinco dias antes. Assustado, abandona o local com a amante, sem chamar a polícia. Não podiam ser vistos juntos.
À noite, em casa, no quadragésimo sétimo andar da Termiteira - edifício construído na época da euforia do petróleo, destinado em particular à burguesia emergente e onde agora ricos e pobres partilham o mesmo espaço, como acontece lá fora, nas ruas da cidade, com a diferença de que aqui vivemos literalmente uns por cima dos outros - quanto mais ricos mas acima - Bartolomeu assiste na televisão à descoberta do cadáver e logo depois um homem sussurra-lhe ao telefone: - Fuja, se está em casa saia agora. Vão matá-lo.
Assustado, recorda afirmações que Núbia fizera e que a serem verdadeiras justificaria que a tivessem atirado de um avião ou de um helicóptero. Ela sabia demais e foi certamente isso que a matou. Decide investigar e cruza-se com singulares e contraditórias testemunhas/personagens: Sangue Frio; Humberto Chiteculo; Benigno dos Santos (sogro de Bartolomeu); Bárbara Dulce (psicóloga, ex-mulher de Bartolomeu); Mouche Shaba (artista plástica); Rato Mickey (ex-António Taborda, sapador de rosto desfigurado); Mãe Mocinha (brasileira que procurou em Luanda um marido bonito e muito preto); Tata Ambroise (curandeiro), etc., etc., e com o Medo, a testemunha principal. Escrevo Medo assim, com maiúsculas, porque não estou a falar dos assuntos minúsculos com que as pessoas comuns convivem no dia-a-dia (...) estou a referir-me, em concreto, ao sentimento de permanente angústia e desamparo que aflige as pessoas com opiniões diferentes em países sujeitos a regimes totalitários.
Assustado, recorda afirmações que Núbia fizera e que a serem verdadeiras justificaria que a tivessem atirado de um avião ou de um helicóptero. Ela sabia demais e foi certamente isso que a matou. Decide investigar e cruza-se com singulares e contraditórias testemunhas/personagens: Sangue Frio; Humberto Chiteculo; Benigno dos Santos (sogro de Bartolomeu); Bárbara Dulce (psicóloga, ex-mulher de Bartolomeu); Mouche Shaba (artista plástica); Rato Mickey (ex-António Taborda, sapador de rosto desfigurado); Mãe Mocinha (brasileira que procurou em Luanda um marido bonito e muito preto); Tata Ambroise (curandeiro), etc., etc., e com o Medo, a testemunha principal. Escrevo Medo assim, com maiúsculas, porque não estou a falar dos assuntos minúsculos com que as pessoas comuns convivem no dia-a-dia (...) estou a referir-me, em concreto, ao sentimento de permanente angústia e desamparo que aflige as pessoas com opiniões diferentes em países sujeitos a regimes totalitários.
O que descobre Bartolomeu? Sobrevive? Se tudo conta, mesmo com medo, é porque não morreu!
E o que é feito de Kianda a cantora de sucesso? Voa de palco em palco até ao voo final. Trágico!
E o que é feito de Kianda a cantora de sucesso? Voa de palco em palco até ao voo final. Trágico!
Dos romances que já li de José Eduardo Agualusa este é o mais estranho e complexo. Não me desiludiu, mas lê-lo não foi tarefa fácil, devido aos saltos espaciais (África, Europa, América), aos muitos avanços e recuos temporais, à alternância de dois narradores, às dezenas de personagens de pequenas histórias, nem todas fundamentais para a narrativa principal.
Cheguei ao fim dos 25 capítulos aturdida mas, há que dizê-lo, fascinada pela beleza da escrita de JEA e mais conhecedora das forças e fraquezas dos seres humanos.
Um dia alguém pintou uma frase na parede do Aeroporto Internacional de Luanda: «Bem-vindo à Lua. Entre e deixe a razão lá fora.»
"Barroco tropical", de José Eduardo Agualusa
Ed. Quetzal, 2018
372 págs.
Um dia alguém pintou uma frase na parede do Aeroporto Internacional de Luanda: «Bem-vindo à Lua. Entre e deixe a razão lá fora.»
"Barroco tropical", de José Eduardo Agualusa
Ed. Quetzal, 2018
372 págs.
Uma leitura não simples, mas que vale, deixa aprendizados! Lindo fds! beijos, chica
ResponderEliminarTens razão Chica.
EliminarEu por norma não desisto de um livro. Fácil ou difícil de ler sempre acabo por me surpreender e aprender. Com uns mais, com outros menos.
Beijo e bom fim-de-semana.
Vou gostar de ler!!!bj
ResponderEliminarGracinha, lê que vais gostar.
EliminarUm dia deste vais começar a ver no "Pétalas de Sabedoria" frases que tirei do romance. São muitas e belas!!
Beijo e bom fim-de-semana.
Um grande escritor.
ResponderEliminarNão li este livro mas, pelo que li nesta tua crónica, parece valer a pena.
Obrigado pela sugestão.
Teresa, um bom fim de semana.
Beijo.
Jaime, só este ano descobri a prosa precisa, envolvente, belíssima de Agualusa. Estou encantada e vou ler tudo o o que dele encontrar.
EliminarEsta não é uma leitura fácil, mas acredita que vale a pena.
Dele tirei bastantes frases para o meu "Pétalas de Sabedoria". Quase gastei um lápis...
Lê, poeta, vais gostar.
Beijo e bom fim-de-semana.
Oi Teresa querida
ResponderEliminarParece uma leitura bem interessante, gostei e vou procurar saber mais sobre esse autor que ainda não conheço.
Beijos
Ani
Também tenho o livro...
ResponderEliminarJá te tinha dito que não me seduz... gostos não se discutem.
Tenho pena, conheço-o de pequenino.
Tem um bom domingo, Teresa.
Abraço amigo.
~~~
O seu blogue é um prazer para descobrir
ResponderEliminarcumprimentos
Obrigada e bem-vindo ao meu Rol.
EliminarBom domingo.
Nunca li, mas vou tomar nota.
ResponderEliminarBom domingo!
Isabel Sá
Brilhos da Moda
Um livro deveras impressionante que retrata com precisão o que se passa nos paises ricos, paises onde a única coisa que falta é honestinada por parte dos governantes; é assim em Angola, é assim no Brasil, é assim na Venezuela e em tantos outros, Teresa. O povo morre de fome e nem sabe da existência de tanta riqueza natural tão preocupado que anda a ver se consegue um pão para a boca. E a propósito, do teu " É preciso que Deus acorde..." aqui mais uma vez digo que Deus está a dormir muito e nāo vê que os desprotegidos, as crianças morrem de doenças, de fome, morrem afogadas no Mediterrâneo, enquanto que os poderosos se " lambuzam " depois de encherem a barriga com as mais variadas iguarias que a natureza desses paises lhes oferece em abundância; dnchem a barriga e depois enchembos bolsos de ouro, diamanyes e outras preciosidades. Sabes, Teresa, não posso pensar em Deua, porque zango-me muito; prefiro referir-me à vida; a mim ninguém me disse que a vida é sempre boa e justa, mas ensinaram- me que Deus era um Ser perfeito, misericordioso e olhava por todos nós. Não sei por que olha por mim ( nāo tenho nem nunca tive grandes problemas ) e não olha por tanta criança que ainda nem sequer sabe o que é uma canção de ninar. Desculpa a minha franqueza, mas sou sempre sincera e ultimamente é assim que penso. O que fiz eu para ser tão abençoada ? Tenho a certeza que não fiz, nem mais nem menos do que tantas pessoas que conheço e outras tantas que desconheço. Como sempre te disse, aqui é um optimo lugar para escolhermos um livro para ler e este será um a comprar. Sou como tu, Teresa, nunca desisto de um livro, por mais dificil que seja a sua leitura. Amiga, daqui a pouco vou - te mandar um e-mail. Um abraço apertadinho e obrigada pelo belo post. Um bom domingo e uma semana ainda melhor
ResponderEliminarEmilia
Emília, tu és abençoada e merecidamente - tens um coração luminoso e do tamanho do mundo. Ser tua amiga é um privilégio.
EliminarBeijo e uma semana feliz e com pouco chorinho...
Já li alguns livros do Águalusa e é um autor de que gosto, vou tentar ler este Barroco Tropical, pois o que a minha amiga escreveu despertou-me a curiosidade.
ResponderEliminarUm abraço e bom Domingo.
Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
Livros-Autografados
(Ainda) não li.
ResponderEliminarO autor passou por aqui e deixou muito boa impressão.
Beijos, boa semana
Estou à espera de poder ler este livro. Gosto imenso deste autor angolano, o José Eduardo Agualusa.
ResponderEliminarGostei da síntese que faz.
Uma boa semana.
Um beijo.
Não li o livro, mas me pareceu muito interessante, despertou a curiosidade, bastante. Boas sugestões por aqui. Um abraço, Teresa.
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