08 novembro, 2013

"O amor é para os parvos" - Manuel Jorge Marmelo

- O amor é para os parvos.
- O amor é para os parvos.
Repetiste, antes de te voltares para trás e deixares que as lágrimas rolassem como gotas de chuva lavando a poeira das paredes. Chorámos ambos, abraçados, para que não pudesses ver o meu rosto, nem eu o teu. O Verão extinguia-se lá fora e nós soubemos, em algum momento daquele nosso abraço, que não era só a estação que chegava ao fim. Talvez tu o soubesses já, mesmo antes de me dizeres que
- O amor é para os parvos.
 
Hoje saí de casa e é já outra vez Outono como no dia em que partiste. Disseste que
- O amor é para os parvos
E foste embora sem olhar para trás, deixando sobre a fronha um resto de ti, uma imagem desfocada, e um recado em que dizias que eu era o teu
- Maior amor
Que partias para me deixar com a vida que é minha e à qual tu não pertencerias nunca. É já tarde, eu sei, mas agora que penso nisso vejo que havia tanto para te dizer. Devia ter-te dito que o meu amor por ti é independente do resto da minha vida; que é como um pássaro enjaulado que quer voar mas tem medo do mundo lá fora porque sente as asas frouxas. Tenho pensado tanto nisso; tenho pensado tanto em ti.
 
Eu amo-te, tu amas-me; logo: separámo-nos. Tu vais e eu fico. Sofres tu e eu sofro também, porque tem mesmo que ser assim e não podia ser de outra maneira. E se calhar tinhas razão – o amor é mesmo para os parvos.
 
Voltei à estante da minha filhota e abasteci-me de uma dulcíssima dose de amor.
Encontrei este monólogo sobre os laços do amor, escrito em prosa poética, escorreita, imaginativa e sensível. E, por vezes, perturbadora.
Quando o tema é o amor… tudo pode acontecer… até “virarmos” parvos.
Paciência!
 
O amor é para os parvos, de Manuel Jorge Marmelo
Ed. Campo das Letras, 2000
117 págs.

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