15 novembro, 2013

"Desgraça" - J.M. Coetzee

Talvez seja bom sofrer uma queda de vez em quando. Desde que não nos quebremos.
Quem o diz é David Lurie, 52 anos, divorciado, professor adjunto de comunicação na Universidade Técnica de Cape, na Cidade do Cabo.
Lurie não gosta de ensinar dá aulas apenas para ganhar a vida, mas gosta de poesia e de escrever sobre pessoas mortas.
Do que ele gosta mesmo, mesmo é de mulheres. Muito!
Cresceu rodeado delas e cedo aprendeu a seduzi-las, amá-las e... abandoná-las. Transformou-se num amante das mulheres, num mulherengo.
… durante anos, décadas, foi essa a espinha dorsal da sua vida.
Os anos passam e um dia, sem aviso prévio, Lurie perde os seus poderes de sedução. As mulheres passam a ignorá-lo e ele entra numa fase de nervosismo e promiscuidade: tem casos com as mulheres dos colegas, engata turistas nos bares, paga a prostitutas, persegue alunas. É raro passar um período sem se apaixonar por alguma das suas alunas.
Ora, numa tarde, ao regressar a casa, avista uma delas, Melanie Isaacs, trinta anos mais nova do que ele, aluna do curso de teatro. Sedutor, aproxima-se dela, sorri, ela... devolve-lhe o sorriso.
- Eu vivo aqui perto. Posso convidá-la para um copo?
Melanie diz que sim e o professor Lurie, um homem solitário, com dois casamentos falhados e uma filha ausente, vai cometer um erro, um enorme erro.
“Professor acusado de assédio sexual”…
Lurie admite publicamente a culpa, demite-se da universidade, fecha a casa, abandona a cidade e parte para junto da filha, Lucy.
- Ficas cá algum tempo? – pergunta ela.
- Uma semana? Podemos pensar numa semana? Só receio que te aborreças.
- Não me aborreço.
- Bom, sabes que és bem-vindo se quiseres ficar.
- É muito simpático da tua parte, querida, mas eu gostava que continuássemos amigos. Longas visitas não são boas para as amizades.
- E se não lhe chamarmos visita? Se lhe chamarmos refúgio? Aceitarias um refúgio sem termo certo?
Aceitou.
Lucy, filha de mãe holandesa, vive sózinha numa pequena quinta, isolada, que comprou com a ajuda do pai, desde que Helen, a companheira, partiu para Johannesburg.
Na quinta, Lucy cultiva hortaliças, frutas e flores. Cria gado. Tem um canil.
Tem o apoio de Petrus, antigo colaborador, agora co-proprietário, que vive na quinta com a família. Amigos, amigos, apenas os vizinhos Bev e Bill Shaw, dois acérrimos defensores dos direitos dos animais.
Lurie aprende a relacionar-se com a filha, a interessar-se pelos animais, a defender o vegetarianismo, a viver numa nova sociedade e a aceitar as complexidades raciais.
Tudo corre bem, até uma tarde de pesadelo, de violência extrema, que os vai modificar, a ambos, de forma profunda e imprevisível.
A história de um país em mudança, falou através da brutalidade de três homens… uma história de maldade.
Segue-se o choque, o medo, a dor, o silêncio, a descoberta, a vergonha.
Lurie sugere que Lucy deixe a quinta, até que as coisas melhorem no país.
- Se eu partir agora… nunca mais volto.
Ele volta para a cidade, experimenta o arrependimento, pede perdão e volta. Volta para dar e receber amor.
O que acarretará ser avô?
Tem de ler novamente Victor Hugo, o poeta dos avós. Poderá aprender alguma coisa.
Aconselho a todos a leitura desta história dura, carinhosa, comovente, grandiosa.
Não se esquece.
 
Desgraça, de J.M. Coetzee (Prémio Nobel de Literatura 2003)
Ed. Dom Quixote, 2000
229 págs.

3 comentários:

  1. Parece um livro extraordinário, Teresa. :)
    Ah, já tenho um lápis todo catita para sublinhar os livros... :D

    Boas leituras!

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  2. Olá André Nuno,
    Acredite que é mesmo um livrão.
    Vai dar-se bem com a "nova técnica". Eu não consigo ler sem um lápis na mão. Não há lápis - não há leitura. Já aconteceu...
    Bom fim-de-semana, com sol, frio, lápis e bom livros.

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    Respostas
    1. Por vezes existem frases e momentos que têm mesmo de ser "Sublinhados"
      Grande livro Teresa!
      http://nososlivros.wordpress.com/2012/02/16/desgraca-j-m-coetzee/
      Beijinhos e boas leituras.

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