06 janeiro, 2012

Némesis" - Philip Roth

O medo castra-nos. O medo degrada-nos.
E vão 31…
Trinta e um livros publicados por Philip Roth, um escritor extraordinário.
Às vezes somos juízes severos de nós mesmos sem nada que o justifique.
O tema deste romance é inquietante e surpreendente: no verão de 1944 uma epidemia de poliomielite grassa nos Estados Unidos. Ao terror da guerra junta-se o pânico da morte provocada por uma doença desconhecida e altamente contagiosa. Não existia nenhum medicamento para tratar a doença, nem vacina para a evitar.
A acção passa-se em Newark, uma cidade abrasadora e húmida, fortemente atingida por surtos anteriores e onde as probabilidades de contrair a doença são enormes.
O protagonista desta surpreendente história é Bucky Cantor (mais uma excelente personagem criada por Philip Roth), vinte e três anos, judeu, professor de educação física e responsável por um recinto de jogos, que assiste impotente ao efeito da epidemia sobre os jovens que, não podendo ir para acampamentos de férias nas montanhas, ocupam o tempo livre no recinto de jogos do bairro.
O Sr. Cantor, órfão, criado pelos avós maternos e educado pelo avô para ser soldado, herda do pai graves problemas de visão que o tornam inapto para o serviço militar. Desiludido mas conformado, dedica-se ao ensino e a transmitir aos jovens os ensinamentos que recebera do avô: perseverança e determinação, terem coragem e destreza físicas, e nunca se deixarem manipular ou, só porque sabiam usar o cérebro, permitir que lhes chamassem judeus lingrinhas e mariquinhas.
O Sr. Cantor vive com a avó e tem uma namorada, Marcia, também judia mas de um outro estrato social. Naquele verão, Marcia vai trabalhar para um acampamento nas montanhas. Ele prefere continuar com os jovens que praticam desporto no recinto de jogos.
Mas quando os seus jovens começam a sucumbir pela doença, ele, impotente, enraivecido e em pânico, foge para junto da namorada, para as montanhas onde o perigo não entrava. Foge, mas a culpa, a humilhação e a raiva persegui-lo-ão. …. uma raiva que não tinha por objecto… nenhuma das causas mais ou menos inverosímeis que as pessoas, mergulhadas no medo e na confusão, pudessem adiantar para explicar a epidemia, nem tão-pouco o vírus da pólio, mas sim a origem, o criador – Deus, que criou o vírus.
Mas o vírus chega à montanha e a dúvida e a culpa consomem-no. Seria ele o culpado do surto de pólio no recinto de jogos? Teria ele levado consigo o vírus para o acampamento?
Apavorado e culpabilizado pela decisão tomada, abandona a namorada e regressa a casa para encetar sozinho uma luta sem tréguas contra a doença que lhe vai mudar fatalmente a vida.
Nunca mais voltámos a ver o Sr. Cantor no bairro… E a história continua a ser contada por um jovem , agora adulto, frequentador do recinto de jogos naquele fatídico verão, conforme lhe foi contada pelo professor de ginástica, a autoridade mais exemplar e respeitada que conhecera.
Não seja inimigo de si próprio. Já há no mundo crueldade que chegue. Foi este o conselho que o aluno deixou ao mestre.
Surpreendente e inquietante este retrato da natureza humana.
(Némesis - deusa grega da vingança e da ética)

Némesis, de Philip Roth
D. Quixote, 2011
Tradução de Francisco Agarez
206 págs.

8 comentários:

  1. Aliciante a sua opinião Teresa.

    Parece ser uma fã incondicional do autor!!

    O título deste livro é igual ao de um da Agatha Christie, Némesis, uma palavra que pode dizer muito sobre o livro, sobre alguma das temáticas principais, a vingança e a ética..


    Boas leituras

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  2. Obrigada Miguel.
    Nunca li Agatha Christie mas conheci algumas obras da autora através do cinema.
    Que tal um desafio para 2012: ler Agatha Christie. Eu até gosto de um bom policial...
    Boas leituras também para si.

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  3. Já acabei de o ler!
    Este é o meu terceiro livro de Roth, foi o melhor livro que li dele, vai direitinho para a lista dos melhores livros que li até agora.
    Desculpe fazer um reparo, mas a história é toda ela contada por Arnie Mesnikoff e não apenas no final. (pagina 86 - "Eu Arnie Mesnikof") Sei que isso é irrelevante para a obra, é apenas um pequeno reparo.

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  4. Olá Tiago,
    Eu gostei muito do livro mas não é o melhor do autor (para mim, claro).
    Eu percebi que o narrador é um antigo aluno frequentador do recinto de jogos. Aliás, repare que eu escrevi "... e a história continua a ser contada por um jovem , agora adulto, frequentador do recinto de jogos naquele fatídico verão, conforme lhe foi contada pelo professor de ginástica..."
    Sabe Tiago, com os livros de Philip Roth eu não viro páginas - leio!
    Fico a aguardar a sua opinião sobre o livro.

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  5. Teresa,

    Peço desculpo, interpretei mal o seu comentário.
    Já agora, na sua opinião qual é o melhor livro de Roth? Eu apenas li três.
    Continuação de bom dia

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  6. Ora Tiago, tudo bem!
    Sobre o melhor de Philip Roth é complicado. Talvez "A conspiração contra a América", "Pastoral Americana", "Casei com um comunista" (fabuloso!). Enfim, é difícil.
    Boas leituras.

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  7. Tenho em casa "A Conspiração Contra a América", comprei quando o livro foi editado pela Sábado, naquela edição barata.
    Até ao fim do ano irei-o ler.

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  8. Philip Roth é, a par de Saramago, um dos meus autores preferidos e "NEMESIS" foi o último (grande) livro que li deste grande autor americano. "HUMILHAÇÃO" foi o melhor livro que li dele, mas para mim todos os que dele li são fabulosos; já tenho o próximo na fila de espera (O COMPLEXO DE PORTNOY") a seguir ao que ando a ler "CONTA CORRENTE 5"-uma pérola da literatura portuguesa do taciturno Vergílio Ferreira, é um diário (já vou no 5) mas é absolutamente enleante e amarro-me a ele de pés e mãos.

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