04 dezembro, 2010

"O Complexo de Portnoy" - Philip Roth

Trata-se de um livro sobre sexo, escrito de uma forma hilariante, sem inibições nem complexos.
Ao longo de 266 páginas, de leitura compulsiva, o protagonista Alexander Portnoy (judeu, filho de uma família da classe média de Newark), num monólogo delirante confessa ao psiquiatra factos que estarão na origem dos seus “actos de exibicionismo, voyeurismo, fetichismo, auto-erotismo”, que o impelem a uma sexualidade insaciável desde a infância à idade adulta.
Spielvoge, o psiquiatra, “pensa que boa parte dos sintomas remetem para os vínculos característicos da relação mãe-filho”.
A mãe, que o trata por “meu amante” é proteccionista “estava tão profundamente implantada na minha consciência que durante o meu primeiro ano de escola eu julguei, tanto quanto me lembro, que cada uma das minhas professoras era a minha mãe disfarçada”, super-vigilante “inspeccionava as minhas contas de somar em busca de erros; em busca de buracos as minhas meias; em busca de sujidade, as minhas unhas, o meu pescoço, e cada costura e refego do meu corpo”, dominadora “ quando me porto mal, ela põe-me fora do apartamento … eu fico à porta a bater, a bater, até jurar que estou pronto a mudar de vida”.
O pai, agente de seguros “que acreditava fervorosamente naquilo que vendia”, é um homem apagado, de choro fácil, que sofre de permanente
prisão de ventre “um pai amável, ansioso, obstipado, incapaz de perceber o que quer que seja” que passa horas enfiado na casa de banho em situações descritas de forma risível.
Tem com os pais uma relação de amor-ódio.
Na adolescência masturba-se na casa de banho, na cama, no cinema, no autocarro. Simula sexo com maçãs, com meias, com fígado que depois será cozinhado pela mãe, com garrafas de leite “passei metade da minha vida desperta trancado na casa de banho, disparando os meus cartuchos … vivia num mundo de lenços de pano ou de papel amarrotados, de pijamas manchados … já lhe contei que quando fiz quinze anos tirei o coiso para fora das calças e bati uma punheta no autocarro 107 de Nova Iorque para Nova Jérsia?”.
Só se interessa por mulheres não judias, como a Macaca, que “foi a realização dos meus mais lascivos sonhos de adolescente… criatura tosca, angustiada, confusa, perdida, sem identidade” com quem vive as maiores perversões sexuais.
Mais tarde conhece Naomi , em Haifa num kibbutz junto à fronteira libanesa, “admirável, corajosa, pelo tipo físico ela é, evidentemente, a minha mãe, o mesmo temperamento, uma autêntica detectora de defeitos, uma crítica profissional da minha pessoa…. exige dos homens a perfeição”, confessa-lhe o seu amor e pede-a em casamento. Como terminará esta história?
Aos 33 anos está solteiro, para grande desgosto dos pais que continuam com os “tem-cuidado e os toma-atenção, não nos deixes sem notícias, não saias da cidade sem nos dizeres”, e a “bater punhetas, sozinho na cama em Nova Iorque”.
Critica os valores judaicos com humor, com ironia, com sarcasmo e considera-se um “tipo demasiado importante para pôr os pés numa sinagoga por um quarto de hora que seja”.
“Senhor Doutor, que nome é que dá a esta doença que eu tenho? Será o sofrimento judaico de que tantas vezes ouvi falar?”
“Sou o filho da anedota de judeus – só que não é anedota nenhuma! Esta gente é inacreditável… aqueles dois são os maiores produtores e distribuidores de culpa do nosso tempo. Conseguem-me fazer acumular culpa como uma galinha acumula gordura”.
Este retrato assombroso/hilariante/humilhante sobre a passagem da adolescência à idade adulta do judeu Alexander Portnoy chega-nos pela mão, do também judeu, Philip Roth.
Assombroso!

O Complexo de Portnoy, de Philip Roth
Dom Quixote
Tradução de Ana Luísa Faria
266 págs.

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